GUSTAVE LOISEAU - Árvores num campo em Ble - Óleo sobre tela - 1917 GUSTAVE LOISEAU - Aldeia junto ao rio Óleo sobre tela - 190...
Humilde sergipano ganha exposição de suas obras em meio à rica coleção do casarão na Lagoa
THÉODORE GÉRICAULT - A balsa da Medusa Óleo sobre tela - 491 x 716 cm - Entre 1818 e 1819 - Museu do Louvre, Paris THÉODORE GÉRICAULT Estudo para A Balsa da Medusa Carvão sobre papel - 28,9 x 20,5 cm - 1818 A terceira década do século XIX seria determinante no cenário artístico europeu, em vários aspectos. A influência neoclássica das academias ficava com os dias contados e surgia, em todos os cantos, variantes artísticas cada vez mais voltadas para uma linguagem mais prática e objetiva. Na pintura francesa, David já não tinha mais a influência de antes e foi da oficina de um dos seus discípulos, Gros, que surgiram dois importantes nomes na pintura francesa: Géricault e Delacroix. Ambos tinham um gênio equivalente, mas de destinos muitíssimo diversos, porque o mais velho, Géricault, morreu em plena juventude, enquanto o segundo, Eugène Delacroix, conseguiu fazer da sua carreira e da sua vida uma obra-prima total. THÉODORE GÉRICAULT - Estudo de cavalo cinza - Óleo sobre tela Aos seus estudos muito intensivos, devia Géricault uma formação acadêmica sã e poderosa, conforme o testemunha a Jangada de Medusa, cuja palpitação trágica constituiu o manifesto dos inovadores. Mas Géricault está mais completamente nos seus desenhos de traços gordos, em que a influência de Miguel Ângelo se afirma com nitidez, e também em quadros de dimensões menores, em que o estilo enobrece certos temas anedóticos, como a Corrida dos cavalos berberes em Roma. O pintor permanecera algum tempo na Inglaterra e o que vira nesse país tinha grandemente favorecido as suas disposições de colorista. GEORGE STUBBS - Whistlejacket Óleo sobre tela - 292 x 246,4 - Cerca de 1762 - National Gallery, Londres Stubbs, apesar de ser do século anterior, teve uma grande influência na produção equestre de trabalhos de Géricault. O permanente fascínio de Géricault por cavalos encontrou expressão na pintura de corridas inglesas. Cavaleiro exímio, morreria jovem, em consequência de ferimentos e ulteriores complicações resultantes de uma série de quedas de cavalo. Era especialmente aficionado por pinturas equestres barrocas e das obras de George Stubbs, tanto por seus expressivos estudos de animais, que introduziram nova temática na arte romântica, quanto por seus incomparáveis estudos anatômicos (Anatomia do cavalo). EUGÈNE DELACROIX - A barca de Dante Óleo sobre tela - 189 x 241 cm - 1822 - Museu do Louvre, Paris Se em Géricault, a visita a território inglês permitiu uma nova abordagem artística, mais determinante ainda foi a influência inglesa para Delacroix. Os pontos de contato são numerosos. A amizade do artista, na juventude, a Richard Parkes Bonington e uma primeira viagem à Grã-Bretanha, fizeram-no seduzir bastante pela maneira fluida e brilhante dos Ingleses. É provável que a Inglaterra lhe servisse de transição para compreender os grandes Flamengos e sobretudo Rubens. Enfim, possuímos o testemunho da revolução que nele produziu Constable. No Salão de 1824, ia expor as Chacinas de Seio, quando o quadro que Constable apresentava nesse mesmo ano lhe caiu sob os olhos. A liberdade, a audácia de toque impressionaram-no de tal modo que refez o seu próprio quadro num estilo mais largo. Nessa época, a sua linha de conduta estava, sem dúvida, já traçada. Este grande homem, que não era somente um grande pintor, porque possuía uma cultura pouco comum, que não cessou de aprofundar e de que deixou provas no seu admirável Jornal, tinha-se, de certo modo, estreado (o que produziu anteriormente não conta) no Salão de 1822 — ano de que se pode datar a consagração oficial da pintura romântica — com um quadro que causou sensação: A Barca de Dante. Todos se apaixonaram por esses corpos de náufragos esverdeados que se torciam dentro da barca, por essa iluminação fulgurante, por essa surda riqueza. Saudado por Thiers, bem acolhido por Gros, insultado pelos davidianos, o artista tornou-se de repente célebre, o que o não dispensou de lutar até ao fim da vida, até para assegurar a sua existência material. EUGÈNE DELACROIX - A morte de Sardanapalus Óleo sobre tela - 395 x 496 cm - 1827 - Museu do Louvre, Paris A sua atitude em relação ao movimento romântico foi bastante ambígua. Consideraram-no, sem nenhuma dúvida, como um dos chefes deste movimento e, a princípio, arregimentou na juventude que lutava ruidosamente. Se ser romântico é pintar de preferência assuntos da Idade Média e da Renascença, então ele o fez com competência. Mas a sua inteligência era demasiado penetrante para que não visse o que havia de falso nesta atitude teatral. Não viajou muito, mas uma dessas viagens, pelo menos, teve importância decisiva: a de Marrocos. Dever-se-á datar daí o Orientalismo ? É pouco provável, porque, com a guerra da independência grega e as narrativas dos viajantes, essa moda tinha-se imposto anteriormente: as Chacinas de Seio foram pintadas antes da estadia em terras da África. Perante as terras africanas, Delacroix não reagiu como a maior parte dos seus contemporâneos. Onde estes tinham procurado o pitoresco, o exotismo, descobriu ele, no trajar e na atitude dos Árabes, a simples beleza do antigo. EUGÈNE DELACROIX - Entrada dos Cruzados em Constantinopla Óleo sobre tela - 81,5 x 105 cm - 1852 EUGENE DELACROIX Sátiro abraçando uma ninfa, cópia de Rubens Óleo sobre tela - 16,5 x 22 cm A audácia de Delacroix avulta sobretudo nas relações que estabeleceu entre a forma e a cor: grandes efeitos obtidos por alguns volumes salientes, em volta dos quais se ordenavam as figuras envolvidas. Este desdém de circunscrever a forma levou os seus contemporâneos a dizerem que ele era mau desenhador. Na verdade, é um desenhador soberbo, embora não tenha nunca possuído — o que por vezes o prejudicou—a bagagem escolar tão sólida de Géricaut. Mas o seu ardor é incomparável: o traço rodeia a forma como uma correia de chicote que vibra, sugerindo um movimento da rapidez do relâmpago. Para se exprimir, não hesitava aliás em recorrer a deformações que causaram surpresa. EUGÈNE DELACROIX - O bom samaritano Óleo sobre tela - 36,8 x 29,8 cm - Entre 1849 e 1850 Embora Delacroix tenha sido reverenciado por artistas mais jovens, e alguns críticos reconhecessem sua importância como pintor, a aceitação oficial foi lenta, por causa da posição ainda dominante dos classicistas. Entretanto, por volta de 1830, ocorreram mudanças nos setores patrocinadores, e Delacroix começou a ter um certo favoritismo oficial e algumas encomendas governamentais. Delacroix também escreveu um jornal, O Diário, que relatava questões artísticas e de diversos outros campos da sociedade de seu tempo. INGRES - A apoteose de Homero - Óleo sobre tela - 386 x 515 cm - Entre 1826 e 1827 Eugène Delacroix só teve no seu tempo um único rival da sua categoria, Jean-Dominique-Ingres, personalidade tão cortante como a sua, senão tão desenvolvida. Os princípios destes dois homens eram tão opostos que se tornava desnecessário que os seus admiradores reforçassem ainda mais uma tal oposição. Eles eram incapazes de se compreender, embora certas palavras que escaparam a um e a outro mostrem que sabiam a que se ater quanto aos seus valores respectivos. Ingres negava com teimosia o romantismo e, aos olhos dum observador superficial, é o sucessor direto do seu mestre David. O mesmo culto do desenho, o mesmo desdém da cor. Esquerda: INGRES - Mulher banhando em Valpinçon - Óleo sobre tela - 146 x 96 cm - 1808 Direita: INGRES - Viscondessa Louise-Albertine d'Haussonville - Óleo sobre tela - 131,8 x 92 cm - 1845 No entanto, por pouco que se ultrapassem as aparências, logo se descobre que estes dois seres se não parecem de forma nenhuma. Ingres, que não possui o temperamento vigoroso de David, é infinitamente mais artista, até no sentido mais mórbido do termo. Este burguês severo era na realidade um recalcado, amante da linha sinuosa e da mulher, na pintura da qual achava uma surda volúpia. As suas grandes composições transbordam por vezes de aborrecimento, é o caso especialmente da sua A Apoteose de Homero. Não atingiu a unidade e o movimento que Delacroix obtinha quase a brincar, mas restam os seus retratos e as suas odaliscas. INGRES - Odalisca com escrava - Óleo sobre tela - 72,4 x 100,3 cm - 1839 CHASSÉRIAU - O tepidarium Óleo sobre tela - 67,3 x 101,5 cm - 1853 Ingres, por vezes, deformava proporções em seus corpos, principalmente os femininos. Mas, seus retratos são irrepreensíveis. Perante eles, todos devemos nos inclinar. A sua oficina foi a última grande escola da pintura francesa. Muitos dos seus discípulos caíram no esquecimento, porque careciam de verdadeiro gênio, embora a maior parte deles tenham sido excelentes retratistas. O mais brilhante foi, na verdade, o único que quis aparentá-lo: Chassériau. O caso deste jovem crioulo, que morreu aos 27 anos, idade em que os outros mal começavam a afirmar-se, depois de ter pintado várias obras-primas, é quase um caso patológico. Porque, por muito que se deplore uma perda considerada em geral irreparável, não há que negar que as obras pintadas por Chassériau no fim da sua curta vida são muito inferiores às da sua estreia, quase da sua adolescência. Poderá admitir-se talvez que a influência de Delacroix, que ele sofria então fortemente, em reação contra o seu antigo mestre, não estava ainda assimilada e que ele não achara o seu equilíbrio. Mas não se trataria também dum desses esgotamentos precoces, como os que se verificam nas crianças dos climas quentes? Seja como for, o certo é que, entre os vinte e os vinte e cinco anos, Chassériau pintou alguns dos retratos essenciais da escola francesa, mais flexíveis, mais sensíveis que os do seu mestre, e também composições dum encanto oriental um pouco irritante e muito requintado. As suas pinturas murais, executadas para o Tribunal das Contas, cuja perda quase integral foi causada pelo furor dos homens e pela sua negligência, revelavam um Chassériau mais amplo, mais viril dó que se poderia supor. A viagem que fez à Argélia mostra-o atraído por uma cor mais sonora, pelo envolvimento das formas; mas não achou nestas tendências o equivalente da poesia linear que o seu mestre Ingres lhe ensinara e lhe convinha admiravelmente. CHASSÉRIAU - Interior oriental - Óleo sobre painel - 46 x 37 - 1850 Como observado anteriormente, todos os grandes mestres da pintura francesa, nas primeiras décadas do século XIX, já possuíam uma grande atração pelos temas orientais. Essa atração ganharia proporções ainda maiores, quando o movimento Orientalista ganharia ainda mais força, fazendo com que caravanas inteiras de artistas partissem rumo ao oriente. Isso é assunto para nossa próxima matéria. VEJA TAMBÉM: . A ARTE NO SÉCULO XIX - Parte 1 . A ARTE NO SÉCULO XIX - Parte 2 . A ARTE NO SÉCULO XIX - Parte 3 . A ARTE NO SÉCULO XIX - Parte 4 . A ARTE NO SÉCULO XIX - Parte 5
ELISEU VISCONTI - Maternidade - Óleo sobre tela - 1906 A aproximação da data (Dia das mães no próximo domingo) sugeriu escrever algo. Mesmo que a comemoração seja uma tentativa comercial de criar mais um período do ano para se consumir presentes; numa espécie de entressafra de natais; um dia reservado às mães é mesmo algo merecido. Muito merecido, por sinal! E se falamos sobre elas, iremos sempre lembrar das muitas imagens que povoam o mundo das artes desde longa data. De fato, a história da arte ocidental está repleta de suas representações desde a Idade Média. Uma mãe e sua criança nos transmitem sempre uma boa sensação. Há todo um universo sugerindo proteção, carinho e calor. E isso mexe com todos nós! LEONARDO DA VINCI - A virgem e O menino com Santa Ana Óleo sobre painel - 168 x 112 - Museu do Louvre, Paris RAFAEL - Madonna do Grão Duque Óleo sobre painel - 1504 a 1505 - Palazzo Pitti, Florença Inúmeras culturas usaram a figura materna para criar símbolos e arquétipos. De uma certa forma, a cultura cristã é a mais responsável por difundir essa imagem da mãe complacente e terna, que afaga e ao mesmo tempo protege, que educa corrigindo, que ensina a ser livre impondo os limites da vida. JEAN BAPTISTE-SIMÉON CHARDIN - A oração antes da refeição Óleo sobre tela - 49,5 x 38,4 - 1740 - Museu Hermitage MARY CASSATT - Mãe e filho Pastel - 1880 As primeiras representações sobre a maternidade evocavam uma lembrança da humanização do divino. A mãe, na figura de Maria, é a ponte que liga o eterno e o terreno, e isso colocou a humanidade mais próxima e acessível daquilo a que ela acreditava. Pelo menos era essa a intenção da Igreja Católica, ao criar tais imagens para educar seus seguidores. Aos poucos, a figura da mãe do filho de Deus foi ganhando ares mais humanos, e adquirindo uma maternidade mais terna e mais ligada a esse mundo. A intimidade e o aconchego de cenas domésticas instigaram pintores de todas as escolas e estilos. Com o passar dos anos, as representações atestam as mudanças estruturais da família, da mãe ganhando um papel secundário e submisso no período feudal até o século XIX, e vindo a ter um papel de destaque na nova estrutura que foi se consolidando no século XX. BERTHE MORISOT - A lição de costura Óleo sobre tela - 1884 CLAUDE MONET - Jean Monet no berço Óleo sobre tela - 1867 PABLO PICASSO - Mãe e filho Óleo sobre tela - 97 x 71 - 1921 Os tempos atuais inspiram cuidados. A família tem se dissolvido e mudado sua forma estrutural mais básica, e isso acontecendo numa velocidade imensa. Muito mais do que líderes do lar, são necessários casais companheiros que devolvam o verdadeiro sentido de viver em sociedade. A mãe ainda é o pilar mais forte na tentativa de resgatar essa estrutura. Felizmente, ainda só é possível chegar a esse mundo através dela. Mesmo que o homem colabore gerando um filho, é a mãe, o "portal" que irá trazê-lo ao mundo externo. NANCY HOWE - Maternidade Óleo sobre tela VICENTE ROMERO REDONDO - Maternidade Pastel - 50 x 61 Que continuemos a nos inspirar nas muitas imagens acolhedoras e promotoras de um mundo melhor, que nos acompanham há vários séculos. Uma mãe que acolhe um filho, acolhe uma nova vida e a esperança de um novo mundo. JOSÉ ROSÁRIO - Na feira - Mista sobre tela - 46 x 65
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Santuário das Aparições de Jacareí SP. são falsas. são verdadeiras, farsa, photoshop, segredoSantuário das aparições de jacareí SP
Maybe it's the art the fruit of an epiphany or maybe she's the boldness of a reverie, eager to take flight and to perpetuate its existence. E talvez tenham sido
MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - Hora da ordenha em Anticoli Corrado Óleo sobre tela - 92,5 x 124 - 1922 - Museu de Zaragoza Abaixo, detalhe de Hora da ordenha em Anticoli Corrado Anos atrás, quando estava escrevendo a matéria sobre o artista brasileiro Pedro Weingärtner, acabei entrando em contato com a obra de Mariano Barbasán Lagueruela. Um fato em comum entre os dois artistas chamou-me a atenção: a visitação constante que fizeram ao povoado italiano de Anticoli Corrado. Não muito distante de Roma, debruçado sobre uma colina, esse pequeno povoado tornou-se um ponto de peregrinação de muitos artistas estrangeiros que iam estudar em Roma, nas décadas finais de 1800 e início de 1900. Weingärtner e Barbasán não apenas visitaram o local com assiduidade, mas o eternizaram exaustivamente em trabalhos minuciosos e maravilhosos. MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - Vem com o papai Óleo sobre painel - 28,8 x 46,9 - 1897 MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA Paisagem com uma vila nos arredores de Roma Óleo sobre tela - 105 x 75 - 1905 MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - Mercado, Anticoli Corrado Óleo sobre tela - 24 x 46 - 1909 Mariano Barbasán Lagueruela e Pedro Weingärtner chegaram em Roma praticamente no mesmo período, nos anos finais do século XIX, a fim de estudar num dos locais que era a melhor referência acadêmica daquele momento. Roma já começava a perder o status de referência artística para Paris, mas ainda assim se mantinha como uma rota quase obrigatória para muitos artistas, principalmente aqueles que ainda se mantinham fiéis às correntes conservadoras realistas, naturalistas e afins. Muitos desses artistas tinham o hábito de se encaminhar para a Piazza di Spagna, em Roma, onde diversos jovens (moças, rapazes e adolescentes), vindos principalmente das redondezas de Roma, em especial Antícoli Corrado, se ofereciam como modelos para aulas e sessões de pinturas. Era no contato com esses modelos que crescia a afinidade entre artistas e o povo desse lugarejo italiano. Nos verões, uma grande caravana de artistas partia para Antícoli Corrado e ali se instalava em estrebarias e currais, que os camponeses transformavam em ateliês e alugavam para os artistas passarem a temporada de produção. MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - Praça em Antícoli Corrado Óleo sobre tela - 94,5 x 85 - 1922 MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - Primeira comunhão Óleo sobre painel - 17,8 x 28,5 - 1900 MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA Pastora com cabras Óleo sobre tela - 147 x 90 - 1910 Durante os dias, os artistas punham a aproveitar ao máximo a luminosidade especial do lugarejo e se encaminhavam para os campos e trigais, onde não cansavam de registrar as famosas cenas de colheitas e pastoreios, que até hoje encantam e são motivos de acirradas disputadas nas melhores casas de leilões de todo o mundo. Durante as noites, em alegres festividades em tabernas locais, ou mesmo em residências particulares, continuavam a produzir estudos dos incansáveis modelos. Muitas dessas moças que se prestavam para posar aos artistas, acabaram se tornando esposas ou amantes deles. A visitação ao pequeno vilarejo era tão intensa que em 1935, já no período final do auge como centro de peregrinação, ainda existiam ali 55 ateliês de artistas, um fato que não deixa de ser curioso, uma vez que ali não possuía, como até hoje, não mais que mil habitantes. MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - Paisagem italiana com cabras e pastores Óleo sobre tela - 24,5 x 46,5 - 1924 MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - Rua em um povoado Óleo sobre tela - 37 x 57,5 - 1909 MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - Procissão - Óleo sobre tela - 1899 As idas para Antícoli Corrado começaram a ficar mais intensas para Mariano Barbasán em 1892. Ele gostou tanto da Itália, que passaria ali trinta anos de sua existência, retornando para sua cidade natal somente no final de sua vida. Ele desenvolveu um gosto tão especial pelas pinturas de costumes locais, que logo ficou famoso entre os colecionadores e era procurado inclusive por turistas desejosos de levar uma lembrança das terras italianas. Assim, ele criou um laço especial com a população camponesa de Antícoli e outros vilarejos vizinhos, principalmente Subiaco. Suas obras dessas localidades se tornaram um relato preciso da vida do homem do campo, o sentimento religioso desses povos e a relação deles mediante à natureza e as suas tradições. Cada trabalho guarda a memória de um tempo especial, tanto para o artista como para a localidade de Antícoli Corrado. MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - La cata - Óleo sobre painel - 29,5 x 47 MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA Plaza de la Retama, Toledo Óleo sobre tela -1887 MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - Pedro II, o Grande, em Las Panizas Óleo sobre tela - 200 x 185 - 1891 Mariano Barbasán Lagueruela nasceu em Saragoça, a 3 de fevereiro de 1864. Ele completou seus estudos artísticos na Escola de Belas Artes de San Carlos, em Valência, onde estudou entre os anos de 1880 e 1887. Para completar os estudos, viajou para Madri para estudar de perto as obras dos grandes mestres espanhóis que admirava. As coleções do Museu do Prado trouxeram um novo impulso para sua formação. Ele também realizou diversas viagens para Toledo, onde pintou diversas cenas de gênero, com cenário histórico. Pintou também várias cenas da literatura europeia. MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - Veneza - Óleo sobre painel - 20,3 x 28,3 - 1889 MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - Aguadoras - Óleo sobre tela - 35,5 x 61 - 1889 MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - Uma vista de Veneza ao por do sol Óleo sobre tela - 61 x 100 Em 1889, com o prêmio que conseguiu pela Província de Saragoça, uma mensalidade vitalícia para estudar na Itália, uma espécie de aposentadoria oferecida a artistas premiados, Barbasán partiu para Roma. Ele produziu as obras mais significativas de sua vida por lá. É de 1892, uma famosa cena num café árabe, de pintores espanhóis em Roma, disfarçados de árabes para um carnaval. MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - O outono - Óleo sobre tela - 50 x 72 - 1918 MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - Tristeza de inverno Óleo sobre tela - 64 x 98 - 1917 MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - Planície alagada - Óleo sobre tela - 50 x 71 - 1917 Barbasán montou um estúdio muito bom em Roma, e fez exposições frequentes por toda a Alemanha, Áustria e Inglaterra. Nunca na Espanha, onde quase nem era conhecido. Em 1912, ele morou na cidade uruguaia de Montevidéu, por um curto período de tempo, enquanto organizava duas exposições que fez por lá. Ele permaneceu em Roma até 1921, quando sua saúde começou a piorar. Retornando à Espanha, ele ocupou uma cadeira na Academia de Belas Artes de San Luis, em Saragoça, que havia ficado vaga com a morte de Francisco Pradilla. MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - Saída para Assis - Óleo sobre painel - 11 x 18 - 1889 MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - Batalha de Guadalete Óleo sobre painel - 21,9 x 50,2 - 1882 MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA - Saída para Tívoli - Óleo sobre painel - 11 x 18 - 1889 Dois anos depois que havia retornado à Espanha, Barbasán realiza a primeira exposição em território espanhol, no Mercado Central de Saragoça. Somente naquela época, seus trabalhos começaram a ser conhecidos e procurados pelo público espanhol. Ele faleceu em Saragoça, no dia 22 de julho de 1924. Em 1925, seu filho Mariano Barbasán Lucaferri realizou uma grande retrospectiva em sua homenagem, no Museu de Arte Moderna de Madri. Ele faria diversas outras nos anos sequentes, ajudando a estabelecer a reputação de seu pai na Espanha. MARIANO BARBASÁN LAGUERUELA Autorretrato Óleo sobre tela - 52 x 41 - 1887
LEOPOLD SCHMUTZLER - Jovem com uma lira Óleo sobre cartão - 100 x 80 LEOPOLD SCHMUTZLER - Salomé Óleo sobre tela - 1920 Por motivos dos mais variados possíveis, artistas caem no gosto popular; e também por motivos variados, caem no esquecimento. Um dos motivos que mais popularizou o artista Leopold Schmutzler foi a representação dramática, bem teatral, de Salomé, interpretada pela atriz e dançarina da época Lili Marberg. A cena tinha todos os atributos para se tornar um dos ícones de sua época e poderia muito bem ter levado o nome de seu autor à glória do cenário artístico mundial, assim como obras anteriores já haviam eternizado outros artistas. Por envolvimento com o partido socialista alemão e pela associação de seu nome com o regime nazista, Schmutzler foi relegado ao esquecimento durante várias décadas do século passado, vindo a retomar prestígio artístico somente no final do século e no início desse. LEOPOLD SCHMUTZLER - Carregando uma jarra Óleo sobre tela LEOPOLD SCHMUTZLER - A dama das margaridas Óleo sobre cartão - 101 x 73 - 1940 Leopold Schmutzler nasceu em Mies, na Áustria, a 29 de março de 1864, vindo de uma família humilde da região. O pai, que trabalhava como seleiro em uma estalagem, foi quem lhe deu as primeiras instruções em desenho. Entre 1880 e 1882, conseguiu aulas na Academia Real de Belas Artes de Viena, e entre os anos de 1882 e 1885 concluiu seus estudos preliminares na Academia de Munique. O artista ainda viria a fazer cursos rápidos em suas passagens por Paris e Roma. Pelos meios que frequentou e pelas influências com a arte realista de sua época, acabou por se tornar um retratista de respeito e bem requisitado, recebendo comissões importantes por parte da família real da Baviera. LEOPOLD SCHMUTZLER - A chegada do pretendente Óleo sobre tela - 69,8 x 91,4 - 1889 LEOPOLD SCHMUTZLER - O centro das atenções Óleo sobre tela - 77,5 x 95,9 Andava muito em voga, naqueles tempos, um estilo realista com influências de Rococó e Art Deco, que dava muita ênfase nos vestuários dos personagens retratados, criando sempre um clima de muita exuberância e elegância, o que tornava todos os trabalhos muito atraentes e decorativos. Schmutzler soube explorar muito bem essa tendência da época, retratando belas modelos em poses insinuantes e descontraídas. A figura da mulher é uma espécie de ícone em quase toda a sua produção. Muitas cenas com mulheres nuas e seminuas se tornaram uma encomenda assídua no seu ateliê. Mas, pela versatilidade com realizava suas obras, também criou várias cenas de gênero. Muitas delas, inspiradas em cortes da Baviera. LEOPOLD SCHMUTZLER - Uma jovem com flores Óleo sobre tela - 100 x 70 - 1940 LEOPOLD SCHMUTZLER - Mulher com cesta - Óleo sobre tela - 91,5 x 108 LEOPOLD SCHMUTZLER - Um look sedutor Óleo sobre cartão - 95 x 68 O envolvimento com o regime nazista, mais no fim de sua vida, mudou um pouco sua produção, com obras que enfatizavam o movimento. Ele chegou inclusive a ser premiado com esses trabalhos, em 1940. Porém, naquele mesmo ano, em 20 de junho, ele faleceria na cidade de Munique. Vários museus, em diversas partes do mundo, começaram a adquirir os seus trabalhos somente no final do século XX. Em especial, o Museu de Arte Frye, em Seatle, que abriga várias obras do artista, provenientes da coleção de Charles Frye, um grande admirador da obra de Schmutzler. Atualmente, seus trabalhos tem conseguido boas cifras em diversas casas de leilões.
JOHN MICHAEL CARTER - Sessão de plein air - Óleo sobre tela “É a solidão que inspira os poetas, cria os artistas e anima o gênio.” Henri Lacordaire Na arte, mais do que em qualquer outro lugar, a solidão torna-se praticamente necessária. Não que ficar sozinho torna alguém naturalmente criativo, mas porque estar em sua própria companhia, permite o melhor conhecimento de si mesmo e do mundo a sua volta. É no silêncio de sua própria companhia que se constroem as mais valiosas pontes para aquilo que a mente pode planejar e as mãos podem executar. Esse refúgio é uma oportunidade que nos permite encontrar com algo de mais precioso escondido em nosso interior e depois trazê-lo ao mundo, porque a solidão é um local muito bom de ser visitado, mas não para ficarmos lá definitivamente. Assim, nascem as mais belas poesias, as músicas mais agradáveis e os quadros mais admiráveis. Toda vez que retiramos para nossa companhia e conseguimos produzir aquilo de mais sincero que há em nós, devemos compartilhá-lo com o mundo. Somos humanos, e viver em sociedade está em nossa essência. A primeira condição para destruir a solidão isolamento é oferecer ao mundo algo que acrescente. FERDINAND SCHAUSS - Eegie - Óleo sobre tela - 138 x 107 O vazio das relações incompreendidas. “Enquanto não atravessarmos a dor de nossa própria solidão, continuaremos a nos buscar em outras metades. Para viver a dois, antes é preciso ser um.” Fernando Pessoa Por uma questão histórica, a palavra solidão não está ligada a situações muito agradáveis. Afinal, ficou o conceito errôneo de que estar em solidão é estar solitário e, associado a isto, estão muitos outros adjetivos indesejáveis: abandonado, isolado, recusado, triste, melancólico... A palavra foi esvaziada de sua real significância. Isso que todos reconhecemos atualmente como solidão, poderíamos chamar de isolamento. A solidão verdadeira nada mais é que um momento de reclusão, de estar consigo, voltar o olhar para dentro e não para fora. Procurar em si mesmo o que nunca encontrará em outra pessoa. Graças ao mau uso da palavra, solidão deixou de ser uma prazerosa opção, para se tornar uma situação da qual se tenta fugir a qualquer custo. EDGAR DEGAS - O absinto - Óleo sobre tela - 92 x 68 - 1876 Os olhos fixados no vazio, procurando encontrar no álcool o refúgio contra uma solidão que nunca será preenchida. Os vícios são prisões difíceis de escapar. “Quando somos abandonados pelo mundo, a solidão é suportável; quando somos abandonados por nós mesmos, a solidão é quase incurável”. Augusto Cury Para certos tipos de solidão, é difícil até descrever. Pense no momento final de um suicida, ou no desespero de um dependente de drogas em profunda abstinência. Pessoas que perderam completamente a perspectiva de tudo. Tornaram-se extremamente isoladas porque esqueceram como oferecer algo ao mundo. Como estão totalmente vazias, não suportam as suas próprias presenças. Um suicida geralmente não quer perder a vida, mas parar a dor imensa que já não suporta mais sentir. Um dependente tenta tão desesperadamente fugir de si, que não consegue mais sobreviver em condições naturais. As drogas se tornam uma prisão aterradora, disfarçadas de uma liberdade que nunca existiu. HUGUES MERLE - Abandonada - Óleo sobre tela - 64,8 x 50,8 - 1872 A espera que o outro possa completar aquilo que falta em ti, pode levar a consequências sem retorno. “Estar com alguém apenas para não estar sozinho é solidão mal administrada”. Martha Medeiros Os ditados populares são de uma riqueza imensa. Quantas vezes ouvimos a expressão, “antes só que mal acompanhado”... Muitas pessoas tem o péssimo hábito de buscar no outro, aquilo que falta nelas. E acabam procurando algo em outras pessoas que estão ainda mais vazias que elas. Isso é uma combinação extremamente perigosa. Quando se está perdido, um caminho qualquer sempre levará a lugar nenhum. FREDERIC EDWIN CHURCH - Crepúsculo no ermo Óleo sobre tela - 101,6 x 162,6 - 1860 No silêncio de algumas horas, o medo de nós mesmos. “A gente foge da solidão, quando tem medo dos próprios pensamentos”. Érico Veríssimo Há momentos em que a natureza está nos convidando à introspecção. É assim ao sair e ao por do sol. Há um silêncio gratuito no ar, nos oferecendo aqueles cenários como espelhos. Ter a coragem de admirar um por de sol é aceitar um reflexo de si mesmo oferecido pela natureza. Por isso, muitas pessoas não suportam os crepúsculos e nem o alvorecer. É no silêncio que se escondem os nossos maiores medos. JESSE SILVER - O chapéu branco, uma cena em Ghiradelli Square Óleo sobre tela - 121,9 x 182,9 As cidades se tornaram um aglomerado de estranhos. “O mal do século é a solidão. Cada um de nós imerso em sua própria arrogância esperando por um pouco de afeição.” Renato Russo Nos tempos modernos, o isolamento parece ter virado moda. Chega a ser um paradoxo, mas exatamente no momento em que a comunicação tecnológica tornou-se mais poderosa, as pessoas se encontram cada vez mais solitárias. As ruas estão apinhadas de pessoas que sequer se olham, sequer se cumprimentam. A internet aproxima os distantes e afasta os próximos. As amizades não são mais construídas no calor do abraço e do aperto de mão, mas nas palavras cada vez mais resumidas de uma comunicação que se extingue. Cidades se tornaram um aglomerado de estranhos, com habitantes que sequer sabem os nomes de seus próprios vizinhos. Ansiedade e depressão são as companheiras dos novos tempos. DOUGLAS OKADA - Tirando um cochilo - Óleo sobre tela - 80 x 110 - 2014 Aos excluídos, um mundo de completo isolamento. “Faça com que a solidão não me destrua. Faça com que minha solidão me sirva de companhia. Faça com que eu tenha a coragem de me enfrentar. Faça com que eu saiba ficar com o nada e assim mesmo me sentir como se estivesse plena de tudo.” Clarice Lispector Já pensaram como a solidão também parece ser uma condição imposta pela sociedade? Para o mundo daqueles que se dizem “normais”, qualquer pessoa que não se “enquadra” ao meio é convidada naturalmente a viver em reclusão. Assim acontece com as pessoas com necessidades especiais, tanto físicas quanto mentais; também com os menos favorecidos; às pessoas com preferências sexuais diferenciadas; aos menos inteligentes... Não poder usar a roupa da moda, não ter o rosto bonitinho, pesar alguns quilos a mais, lutar por causas aparentemente impossíveis, são apenas alguns dos exemplos daqueles que não conseguem suportar a terrível condição que diariamente impõe o mundo dos ditos “normais”. E, como muitas dessas pessoas excluídas não conseguem arranjar forças para travar suas lutas solitárias, muitos desistem e infelizmente se isolam e se anulam ainda mais. É o olhar comparativo que nos lança nas mais sombrias jaulas. Cada pessoa é um ser único e possui valores que são só delas. É se conhecendo melhor que cada um resgata seus próprios valores. E não conseguirá isso se tiver medo da solidão que pede introspecção. FRAGONARD - Uma jovem leitora - Óleo sobre tela - 81,1 x 64,8 - 1770 Na busca pelo conhecimento de si, valem a calma de uma música, o retiro para uma sincera oração e os tesouros de uma boa leitura. “Se desejas saber quem és, observa o que pensas, quando estás sem ninguém”. Chico Xavier É o que você faz em seus momentos de ócio, que determinará o que você é em todos os outros momentos. Converse mentalmente consigo, conheça-te antes de querer conquistar o mundo, trave os diálogos mais temidos com suas dúvidas e não saia de sua presença sem que os tenha resolvido, não adie o autoconhecimento. Inspire-se por boas músicas, que confortem e deem paz a sua alma. Se é religioso, aprofunde os conhecimentos de sua fé. Leia bons livros, são companheiros que estão sempre disponíveis para aqueles que os procuram. Numa antiga canção, uma frase dizia que “no interior da gente há uma casa, a porta da frente vive aberta”. Não hesite, entre, faça a companhia necessária ao seu próprio interior. Mas, não se esqueça, a paz que irá conquistar e o bem-estar que irá sentir também devem ser divididos com o mundo. Não nascemos para ser ostras. Não se assuste quando sair de sua companhia e voltar ao mundo. Ao se conhecer melhor, o mundo não muda, mas muda a maneira como o vemos e o aceitamos. A nitidez do que é mais pesado, torna-nos apenas mais leves.
THÉODORE GÉRICAULT - A balsa da Medusa Óleo sobre tela - 491 x 716 cm - Entre 1818 e 1819 - Museu do Louvre, Paris THÉODORE GÉRICAULT Estudo para A Balsa da Medusa Carvão sobre papel - 28,9 x 20,5 cm - 1818 A terceira década do século XIX seria determinante no cenário artístico europeu, em vários aspectos. A influência neoclássica das academias ficava com os dias contados e surgia, em todos os cantos, variantes artísticas cada vez mais voltadas para uma linguagem mais prática e objetiva. Na pintura francesa, David já não tinha mais a influência de antes e foi da oficina de um dos seus discípulos, Gros, que surgiram dois importantes nomes na pintura francesa: Géricault e Delacroix. Ambos tinham um gênio equivalente, mas de destinos muitíssimo diversos, porque o mais velho, Géricault, morreu em plena juventude, enquanto o segundo, Eugène Delacroix, conseguiu fazer da sua carreira e da sua vida uma obra-prima total. THÉODORE GÉRICAULT - Estudo de cavalo cinza - Óleo sobre tela Aos seus estudos muito intensivos, devia Géricault uma formação acadêmica sã e poderosa, conforme o testemunha a Jangada de Medusa, cuja palpitação trágica constituiu o manifesto dos inovadores. Mas Géricault está mais completamente nos seus desenhos de traços gordos, em que a influência de Miguel Ângelo se afirma com nitidez, e também em quadros de dimensões menores, em que o estilo enobrece certos temas anedóticos, como a Corrida dos cavalos berberes em Roma. O pintor permanecera algum tempo na Inglaterra e o que vira nesse país tinha grandemente favorecido as suas disposições de colorista. GEORGE STUBBS - Whistlejacket Óleo sobre tela - 292 x 246,4 - Cerca de 1762 - National Gallery, Londres Stubbs, apesar de ser do século anterior, teve uma grande influência na produção equestre de trabalhos de Géricault. O permanente fascínio de Géricault por cavalos encontrou expressão na pintura de corridas inglesas. Cavaleiro exímio, morreria jovem, em consequência de ferimentos e ulteriores complicações resultantes de uma série de quedas de cavalo. Era especialmente aficionado por pinturas equestres barrocas e das obras de George Stubbs, tanto por seus expressivos estudos de animais, que introduziram nova temática na arte romântica, quanto por seus incomparáveis estudos anatômicos (Anatomia do cavalo). EUGÈNE DELACROIX - A barca de Dante Óleo sobre tela - 189 x 241 cm - 1822 - Museu do Louvre, Paris Se em Géricault, a visita a território inglês permitiu uma nova abordagem artística, mais determinante ainda foi a influência inglesa para Delacroix. Os pontos de contato são numerosos. A amizade do artista, na juventude, a Richard Parkes Bonington e uma primeira viagem à Grã-Bretanha, fizeram-no seduzir bastante pela maneira fluida e brilhante dos Ingleses. É provável que a Inglaterra lhe servisse de transição para compreender os grandes Flamengos e sobretudo Rubens. Enfim, possuímos o testemunho da revolução que nele produziu Constable. No Salão de 1824, ia expor as Chacinas de Seio, quando o quadro que Constable apresentava nesse mesmo ano lhe caiu sob os olhos. A liberdade, a audácia de toque impressionaram-no de tal modo que refez o seu próprio quadro num estilo mais largo. Nessa época, a sua linha de conduta estava, sem dúvida, já traçada. Este grande homem, que não era somente um grande pintor, porque possuía uma cultura pouco comum, que não cessou de aprofundar e de que deixou provas no seu admirável Jornal, tinha-se, de certo modo, estreado (o que produziu anteriormente não conta) no Salão de 1822 — ano de que se pode datar a consagração oficial da pintura romântica — com um quadro que causou sensação: A Barca de Dante. Todos se apaixonaram por esses corpos de náufragos esverdeados que se torciam dentro da barca, por essa iluminação fulgurante, por essa surda riqueza. Saudado por Thiers, bem acolhido por Gros, insultado pelos davidianos, o artista tornou-se de repente célebre, o que o não dispensou de lutar até ao fim da vida, até para assegurar a sua existência material. EUGÈNE DELACROIX - A morte de Sardanapalus Óleo sobre tela - 395 x 496 cm - 1827 - Museu do Louvre, Paris A sua atitude em relação ao movimento romântico foi bastante ambígua. Consideraram-no, sem nenhuma dúvida, como um dos chefes deste movimento e, a princípio, arregimentou na juventude que lutava ruidosamente. Se ser romântico é pintar de preferência assuntos da Idade Média e da Renascença, então ele o fez com competência. Mas a sua inteligência era demasiado penetrante para que não visse o que havia de falso nesta atitude teatral. Não viajou muito, mas uma dessas viagens, pelo menos, teve importância decisiva: a de Marrocos. Dever-se-á datar daí o Orientalismo ? É pouco provável, porque, com a guerra da independência grega e as narrativas dos viajantes, essa moda tinha-se imposto anteriormente: as Chacinas de Seio foram pintadas antes da estadia em terras da África. Perante as terras africanas, Delacroix não reagiu como a maior parte dos seus contemporâneos. Onde estes tinham procurado o pitoresco, o exotismo, descobriu ele, no trajar e na atitude dos Árabes, a simples beleza do antigo. EUGÈNE DELACROIX - Entrada dos Cruzados em Constantinopla Óleo sobre tela - 81,5 x 105 cm - 1852 EUGENE DELACROIX Sátiro abraçando uma ninfa, cópia de Rubens Óleo sobre tela - 16,5 x 22 cm A audácia de Delacroix avulta sobretudo nas relações que estabeleceu entre a forma e a cor: grandes efeitos obtidos por alguns volumes salientes, em volta dos quais se ordenavam as figuras envolvidas. Este desdém de circunscrever a forma levou os seus contemporâneos a dizerem que ele era mau desenhador. Na verdade, é um desenhador soberbo, embora não tenha nunca possuído — o que por vezes o prejudicou—a bagagem escolar tão sólida de Géricaut. Mas o seu ardor é incomparável: o traço rodeia a forma como uma correia de chicote que vibra, sugerindo um movimento da rapidez do relâmpago. Para se exprimir, não hesitava aliás em recorrer a deformações que causaram surpresa. EUGÈNE DELACROIX - O bom samaritano Óleo sobre tela - 36,8 x 29,8 cm - Entre 1849 e 1850 Embora Delacroix tenha sido reverenciado por artistas mais jovens, e alguns críticos reconhecessem sua importância como pintor, a aceitação oficial foi lenta, por causa da posição ainda dominante dos classicistas. Entretanto, por volta de 1830, ocorreram mudanças nos setores patrocinadores, e Delacroix começou a ter um certo favoritismo oficial e algumas encomendas governamentais. Delacroix também escreveu um jornal, O Diário, que relatava questões artísticas e de diversos outros campos da sociedade de seu tempo. INGRES - A apoteose de Homero - Óleo sobre tela - 386 x 515 cm - Entre 1826 e 1827 Eugène Delacroix só teve no seu tempo um único rival da sua categoria, Jean-Dominique-Ingres, personalidade tão cortante como a sua, senão tão desenvolvida. Os princípios destes dois homens eram tão opostos que se tornava desnecessário que os seus admiradores reforçassem ainda mais uma tal oposição. Eles eram incapazes de se compreender, embora certas palavras que escaparam a um e a outro mostrem que sabiam a que se ater quanto aos seus valores respectivos. Ingres negava com teimosia o romantismo e, aos olhos dum observador superficial, é o sucessor direto do seu mestre David. O mesmo culto do desenho, o mesmo desdém da cor. Esquerda: INGRES - Mulher banhando em Valpinçon - Óleo sobre tela - 146 x 96 cm - 1808 Direita: INGRES - Viscondessa Louise-Albertine d'Haussonville - Óleo sobre tela - 131,8 x 92 cm - 1845 No entanto, por pouco que se ultrapassem as aparências, logo se descobre que estes dois seres se não parecem de forma nenhuma. Ingres, que não possui o temperamento vigoroso de David, é infinitamente mais artista, até no sentido mais mórbido do termo. Este burguês severo era na realidade um recalcado, amante da linha sinuosa e da mulher, na pintura da qual achava uma surda volúpia. As suas grandes composições transbordam por vezes de aborrecimento, é o caso especialmente da sua A Apoteose de Homero. Não atingiu a unidade e o movimento que Delacroix obtinha quase a brincar, mas restam os seus retratos e as suas odaliscas. INGRES - Odalisca com escrava - Óleo sobre tela - 72,4 x 100,3 cm - 1839 CHASSÉRIAU - O tepidarium Óleo sobre tela - 67,3 x 101,5 cm - 1853 Ingres, por vezes, deformava proporções em seus corpos, principalmente os femininos. Mas, seus retratos são irrepreensíveis. Perante eles, todos devemos nos inclinar. A sua oficina foi a última grande escola da pintura francesa. Muitos dos seus discípulos caíram no esquecimento, porque careciam de verdadeiro gênio, embora a maior parte deles tenham sido excelentes retratistas. O mais brilhante foi, na verdade, o único que quis aparentá-lo: Chassériau. O caso deste jovem crioulo, que morreu aos 27 anos, idade em que os outros mal começavam a afirmar-se, depois de ter pintado várias obras-primas, é quase um caso patológico. Porque, por muito que se deplore uma perda considerada em geral irreparável, não há que negar que as obras pintadas por Chassériau no fim da sua curta vida são muito inferiores às da sua estreia, quase da sua adolescência. Poderá admitir-se talvez que a influência de Delacroix, que ele sofria então fortemente, em reação contra o seu antigo mestre, não estava ainda assimilada e que ele não achara o seu equilíbrio. Mas não se trataria também dum desses esgotamentos precoces, como os que se verificam nas crianças dos climas quentes? Seja como for, o certo é que, entre os vinte e os vinte e cinco anos, Chassériau pintou alguns dos retratos essenciais da escola francesa, mais flexíveis, mais sensíveis que os do seu mestre, e também composições dum encanto oriental um pouco irritante e muito requintado. As suas pinturas murais, executadas para o Tribunal das Contas, cuja perda quase integral foi causada pelo furor dos homens e pela sua negligência, revelavam um Chassériau mais amplo, mais viril dó que se poderia supor. A viagem que fez à Argélia mostra-o atraído por uma cor mais sonora, pelo envolvimento das formas; mas não achou nestas tendências o equivalente da poesia linear que o seu mestre Ingres lhe ensinara e lhe convinha admiravelmente. CHASSÉRIAU - Interior oriental - Óleo sobre painel - 46 x 37 - 1850 Como observado anteriormente, todos os grandes mestres da pintura francesa, nas primeiras décadas do século XIX, já possuíam uma grande atração pelos temas orientais. Essa atração ganharia proporções ainda maiores, quando o movimento Orientalista ganharia ainda mais força, fazendo com que caravanas inteiras de artistas partissem rumo ao oriente. Isso é assunto para nossa próxima matéria. VEJA TAMBÉM: . A ARTE NO SÉCULO XIX - Parte 1 . A ARTE NO SÉCULO XIX - Parte 2 . A ARTE NO SÉCULO XIX - Parte 3 . A ARTE NO SÉCULO XIX - Parte 4 . A ARTE NO SÉCULO XIX - Parte 5
COLUMBANO - O Grupo do Leão Óleo sobre tela, 200 x 380 Sentados, da esquerda para a direita: Henrique Pinto, José Malhoa, João Vaz, Silva Porto, Antônio Ramalho, Moura Girão, Rafael Bordalo Pinheiro e Rodrigues Vieira. De pé, da esquerda para a direita: Ribeiro Cristino, Alberto d'Oliveira, Manuel Fidalgo (empregado de mesa), Columbano, Dias (criado), Antônio Monteiro e Cipriano Martins. Ao longo da História da Pintura, artistas sempre se organizaram e defenderam sensos estéticos que tivessem uma ótica parecida. Foi assim com a Escola de Barbizon, a Escola do Rio Hudson, os do Grupo Macchiaiolio, Impressionistas, Nabis... Dividiam os mesmos temas, técnicas e desenvolviam quase sempre uma nova proposta ou jeito de ver e fazer novos trabalhos. Também não foi diferente com o Grupo do Leão, movimento significativo que revolucionou a História da Pintura em Portugal. SILVA PORTO - Na cisterna Óleo sobre tela, 42,5 x 56,5 MARQUES DE OLIVEIRA - À espera dos barcos Óleo sobre tela, 77,5 x 97 Entender as propostas e desafios enfrentados pelo Grupo do Leão, requer situar primeiramente em que contexto histórico ele veio a se formar. É a condição na qual se encontrava o país, o principal fator para os objetivos do grupo. Lá pela metade do século XIX, Portugal ainda sofria grandes traumas pela saída da família real portuguesa, desde sua ida para o Brasil, no início do século. Não bastasse a grande ausência da corte, veio a seguir, a perda da colônia brasileira e uma guerra civil massacrante, que durante longos anos, fez confrontar absolutistas e liberais. Em meio a esse caos aparente, o país tenta ressuscitar modernizando o máximo possível. Algumas primeiras iniciativas no parque industrial e comercial, e uma dinamização na agricultura, chegaram até a produzir um significativo efeito. Obras públicas como a inauguração da primeira via férrea, bem como a melhoria de estradas e pontes ganharam até um nome: Fontismo, em homenagem ao nome do ministro que as promoveu, Fontes Pereira de Melo. Ainda que muitos imprevistos tenham prejudicado o pleno êxito dessas iniciativas, o país consegue um certo progresso, mas, um pouco acanhado se comparado ao resto do continente. Há um êxodo rural significativo e cidades como Lisboa e Porto chegam a ter população e áreas dobradas já no final do século XIX. Até os movimentos culturais do país parecem estar em descompasso com o turbilhão de novidades que vivia o resto da Europa. MALHOA - Os bêbados Óleo sobre tela, 150 x 200 CARLOS REIS - O batizado Óleo sobre tela, 130 x 166 ARTHUR LOUREIRO - Campina romana Óleo sobre tela, 81 x 146,5 Em 1879, Antônio Silva Porto assume a docência da cadeira de Paisagem na Academia Real de Belas-Artes, em Lisboa, e promove o que talvez tenha sido uma das maiores revoluções artísticas do país: o Naturalismo. Silva Porto, juntamente com seus alunos e seguidores, reuniam constantemente na cervejaria Leão d’Ouro, na Rua Primeiro de Dezembro. Ficaram, por isso, conhecidos como o Grupo do Leão. SILVA PORTO - Ceifeiras Óleo sobre tela, 90,5 x 120,3 MALHOA - Músicos em dia de festa Óleo sobre tela Como e por que Silva Porto abraçou esta proposta? Voltando um pouco mais na história desse artista, sabemos que ele, juntamente com João Marques de Oliveira, foram enviados a Paris como bolsistas do Estado. À procura de base acadêmica, a que eram enviados todos os estudantes de arte que desembarcavam em Paris, os estudos desses jovens artistas portugueses começaram a ganhar maior influência de uma nova tendência que atraía muitos adeptos: o círculo de artistas liderados por Charles Daubigny. Considerado o fundador da Escola de Barbizon, uma pequena aldeia que ficava nos arredores da floresta de Fontainebleau, Daubigny incutia nos seus discípulos a prática de um paisagismo que se empenhava muito mais em captar os efeitos da luz do que registrar pormenores dos motivos representados. Isso seria levado a conseqüências muito mais concretas e audaciosas com os Impressionistas, que tiveram influência evidente da Escola de Barbizon, até porque viviam e expunham seus trabalhos na mesma época. Silva Porto e Marques de Oliveira tiraram boas lições dessa fase, não só fixando nos ensinamentos de Daubigny, como se abrindo a outros experimentos, como os que fazia Millet, que além da proposta naturalista, povoava suas telas com camponeses realistas e sofridos. Mas, os jovens artistas foram também até a Itália. Em Roma, Marques de Oliveira se especializa na pintura histórica, para a qual ganhou sua bolsa, e Silva Porto vai mais ao sul, fixando estadia em Capri. Sob a forte luz do Mediterrâneo, muito mais brilhante que os tons soturnos da sua estada em Paris, ele muda consideravelmente sua paleta. SILVA PORTO - A volta do mercado Óleo sobre tela, 114 x 151 ANTÔNIO RAMALHO - O lanterneiro Óleo sobre tela, 106 x 87 JOÃO VAZ - No Tejo Óleo sobre tela, 94 x 152 Já de volta a Portugal, quando recebe o convite para a cadeira de Paisagem, Silva Porto não é apenas um pintor com influências de Barbizon, é também um eclético artista, com variadas combinações brilhantes e bem distintas, conseqüência dos aprendizados que praticara na Itália. O que viria direcionar Silva Porto ao Naturalismo, é a busca constante, em sua obra, de uma temática voltada sempre ao campo. O que ele fez, não foi buscar um tema idílico e imaginário. Muito pelo contrário, apenas abriu os olhos para o ritmo lento e atrasado do processo de desenvolvimento português. Para ele e todos os que se deixaram guiar por ele, a temática se tornara quase uma lei. É na vida das aldeias que residia a verdade mais pura de sua época e de seu país. Nascia ali, a grande saga do maior movimento artístico português. MALHOA - A sesta Óleo sobre madeira, 32,5 x 41 SOUSA PINTO - Le baquet bleu Óleo sobre tela, 77 x 61 MALHOA - Cócegas Óleo sobre tela, 218,5 x 285 Mesmo surgindo tardiamente nas terras portuguesas e partindo do modelo influenciado nos aprendizados de Barbizon, o Naturalismo português viria a se desenvolver de forma original, colocando-se entre uma das mais importantes escolas naturalistas mundiais. O que mais marcou o ensino do mestre Silva Porto não eram as enfadonhas aulas teóricas. Ele e seus alunos juntavam os cavaletes e partiam para o campo, fazendo dessa atividade a base prioritária do movimento. Era ali, que durante tempos a fio, ficavam a representar incansavelmente lugares previamente escolhidos. Captavam o vigor da luz, os verdes e amarelos da vegetação, os ocres avermelhados do solo português e os tons cinzas e azulados da atmosfera. À partir daí, se trancavam nos ateliers nos meses de inverno e outono, e transformavam esses estudos, muitas vezes dinâmicos e liberais, em composições um pouco mais disciplinadas que viessem agradar a público e crítica. Esse foi, certamente, o ponto mais negativo da grande proposta que sugeria Silva Porto. Por adequar a um gosto mais provinciano e de poucos horizontes, o Naturalismo português caiu na velha receita acadêmica, contra a qual lutavam muitos outros movimentos pela Europa. Prova disso, é que hoje os estudos livres e despojados de ar livre, feitos por todos os naturalistas portugueses que saiam a campo, sejam vistos com maior empenho por colecionadores e galerias. HENRIQUE PINTO - A saída do rebanho Óleo sobre madeira, 40,5 x 31,6 SOUZA PINTO - Mulher bordando Pastel sobre papel, 32 x 22,3 SILVA PORTO - Barcos ancorados Óleo sobre tela Independente de terem colaborado ou não para a grande revolução pictórica que a Europa assistiu nos anos finais do século XIX, nunca houve em Portugal, uma pintura tão popular como a dos Naturalistas. E, mesmo que acanhados, se comparados às propostas ousadas de Monet e sua turma, os naturalistas ganharam títulos e pompas de “modernistas” para sua época. Além de Silva Porto e Marques de Oliveira, é inegável o destaque de outros dois componentes do grupo: Columbano Bordalo Pinheiro e José Malhoa. Há quem diga que os dois até transcenderam seus mestres. CARLOS REIS - Paisagem do Rio Almonda Pastel sobre cartão, 54 x 74 MALHOA - A curar a roupa Óleo sobre tela, 63 x 75 SILVA PORTO - Recanto de praia Óleo sobre madeira, 31,5 x 54,5 Columbano foi o mais atípico desse grupo. Averso que era ao exercício natural, dava-se mais ao retrato, e é dele a famosa tela do grupo, em momento de confraternização na cervejaria. De cores muito bem trabalhadas em incansáveis veladuras, era dono ainda de uma paleta com grande sutileza de matizes. Retratou não só todos os amigos pintores, como todos os mais importantes vultos da sociedade portuguesa daquela época. Com todos os méritos, Malhoa foi sem dúvida, o mais popular e querido dos pintores portugueses. Era ele o artista que encarnou com maior vitalidade, a linguagem que representou a realidade de um país. Conseguiu uma organização plástica que não diminuía, mas, que exaltava de uma forma positiva todo o atraso cultural e revolucionário de uma nação em relação ao resto do continente. A extrema pobreza e os costumes tão primitivos e aparentemente pequenos, ganham em suas obras uma grandiosidade incomparável. E faz isso com largas pinceladas, abusivas e bem colocadas texturas, guiando a luz com uma magistral competência. MALHOA - O fado Óleo sobre tela, 150 x 183 SILVA PORTO - Guardando o rebanho Óleo sobre tela, 160 x 200 HENRIQUE PINTO - Entre o milharal Óleo sobre tela, 135 x 94 Outros artistas se despontaram bem rápido com o Naturalismo. São muito bem elaboradas e representadas as marinhas de João Vaz, feitas com pinceladas espontâneas e conseguindo uma atmosfera bem convincente para as águas e seus reflexos. Antônio Ramalho se destaca nos retratos, mas, ainda dentro da proposta naturalista, tem uma diversificada temática paisagística. No Porto, Marques de Oliveira desempenha o mesmo papel desenvolvido em Lisboa, por Silva Porto. Em sucessivas gerações de discípulos e seguidores, difundiu um paisagismo com grande qualidade, sempre tendo referências os ensinamentos dos tempos de Barbizon e suas vertentes mais modernas, como Corot. SILVA PORTO - Charneca de belas ao por do sol Óleo sobre tela, 85 x 150 SOUZA PINTO - Barco desaparecido Óleo sobre tela, 73 x 91 SILVA PORTO - No Areinho Óleo sobre madeira, 37,4 x 56 José Júlio de Souza Pinto foi o pintor naturalista português que mais tempo viveu no exterior, passando uma grande parte de sua vida e carreira na Bretanha, nunca deixando, porém, de ressaltar os laços com Portugal. Suas experiências em pastéis, que o habilitam como pintor hábil e técnico, são suas obras mais relevantes. Mesmo com uma paleta bem ousada e forte influência impressionista, o artista não se rende de todo a esse movimento. Fica a praticar obras de agrado ao público, ainda mais tendentes ao academicismo. Não que isso seja de todo um defeito, mas, o distancia um pouco da proposta mais vanguardista de muitos artistas de sua época. Arthur Loureiro teve também significativa relevância no movimento. Passou um longo período de sua vida na Austrália. Suas obras tendem a uma linguagem mais simbólica, parecendo às vezes, distanciar um pouco mais da proposta naturalista do grupo. AURÉLIA DE SOUSA - Cena de interior com mulher a coser Óleo sobre tela, 41 x 32 JOAQUIM LOPES - Sol da tarde, Veiga da Urgeira Óleo sobre tela, 59 x 80 MARQUES DE OLIVEIRA - Vista de praia com barcos e mulheres Óleo sobre madeira, 22,5 x 35 Uma das figuras de maior destaque na Segunda Geração dos Naturalistas Portugueses foi Carlos Reis. Teve como herança a pintura de gênero de Silva Porto, mas com um lirismo gestual influenciado por Malhoa. Insistente que foi na manutenção acadêmica de suas obras, foi perdendo um pouco o interesse do público, que já se abria aos novos movimentos do continente. Manuel Henrique Pinto dedicou-se quase esclusivamente à prática de paisagens. Era muito amigo e influenciado por Malhoa e teve em Figueiró dos Vinhos, a maioria dos palcos de suas obras. De vital importância ao movimento naturalista português, foi Alberto de Oliveira, incansável no seu trabalho de promoção do grupo. Rafael Bordalo Pinheiro, caricaturista e ceramista, foi um dos mais criativos artistas do final do século XIX, em Portugal. Viveu um período de conturbação política quando esteve no Brasil entre 1875 e 1879. Sua ligação com o Brasil teve longa história, mesmo colecionando desafetos pelas críticas e charges que muitas vezes ofendiam políticos e celebridades. MALHOA - Figura sentada a ler Óleo sobre tela colada sobre cartão, 26 x 31 FALCÃO TRIGOSO - Paisagem de rio com trigoso Óleo sobre tela, 81,5 x 110 ALFREDO KELIL - Vista da Guia com figuras Óleo sobre cartão, 23 x 35 A lista de artistas ligados ao movimento naturalista é grande. Vale citar nomes como Henrique Pousão, o Rei D. Carlos, Luciano Freire, Alfredo Kelil e a pintora Aurélia de Sousa. Também se fazem presentes Moura Girão, Rodrigues Vieira, Ribeiro Cristino, Alberto d’Oliveira, Falcão Trigoso, Joaquim Lopes, Antônio Monteiro, Cipriano Martins e muitos outros, que mesmo não tendo expostos seus trabalhos nas coletivas do grupo, tiveram uma grande influência do Naturalismo em suas obras. Entre 1881 e 1889 foram realizadas 8 exposições dos chamados “naturalistas portugueses”, que alternaram participantes em muitas delas. MARQUES DE OLIVEIRA - Praia dos pescadores, Póvoa do Varzim Óleo sobre madeira, 22,5 x 35 CARLOS REIS - Lousã ao longe Óleo sobre tela,48,2 x 65,7 Ao mesmo tempo que mostrou ao mundo uma valiosa produção enquanto durou, o movimento Naturalista Português fez com que o país sofresse por seu caráter um tanto quanto bairrista. Durante todo o início do século XX, movimentos artísticos importantes se viram praticamente barrados em Portugal. Do Cubismo ao Expressionismo, passando pelo Futurismo e Arte Abstrata, todos eles não tiveram espaço por um longo tempo. Mas, não vale realçar tal equívoco. O que fizeram e significaram todos os artistas daquela época, estará merecidamente para sempre na História da Arte.
GEROLAMO INDUNO - O cumprimento - Óleo sobre tela - 85,3 x 126,5 - 1877 GEROLAMO INDUNO - A lição do baile - Óleo sobre tela - 107 x 135,5 A Itália sempre foi um berço nato de grandes artistas, em diversas épocas da história. Há quem diga que o ápice artístico italiano se deu no Renascimento, e isso tem lá suas verdades. Mas, a grandiosidade da pintura e escultura italianas não se resumiu somente a esse período. Os anos de 1800, que eles carinhosamente chamam de Ottocento, reservaram aos artistas italianos um período muito prolífico, de uma arte voltada para as coisas “de casa”, uma maneira de dizer que voltaram os olhos para uma arte mais intimista e nacionalista. Essa fase tornou-se também mais um grande período da arte italiana. GEROLAMO INDUNO - Donne romane, scena conteporanea - Óleo sobre tela - 76 x 101 - 1864 GEROLAMO INDUNO - Criança amada - Óleo sobre tela - 54,4 x 74 - 1871 Nesse período, é imprescindível falar dos artistas que desenvolveram uma arte acadêmica que é respeitada até hoje. Com vertentes que voltaram o olhar para o Realismo e o Naturalismo, os trabalhos desse período nos revelam artistas donos de um domínio técnico admirado e com uma criatividade de composição invejáveis para qualquer época. Gerolamo Induno, entre muitos outros pintores italianos dessa época, é daqueles artistas que a história precisa relembrar e cujas obras necessitam tornar referência para os tempos atuais. GEROLAMO INDUNO - A partida dos voluntários de 1966 (estudo) Óleo sobre tela - Entre 1877 e 1878 GEROLAMO INDUNO - A partida dos voluntários - Óleo sobre tela Gerolamo Induno nasceu em Milão, a 13 de dezembro de 1825, filho mais novo de Marcos e Julia Somaschi. A arte o acompanhou desde cedo, até porque o seu irmão, Domenico Induno, dez anos mais velho que ele, começou prematuramente nas artes e tornou-se uma referência natural sua. Ambos estudaram na Academia Brera, sob os ensinamentos de Luigi Sabatelli. Gerolamo ficaria naquela instituição entre 1839 e 1846. Conseguiu prêmios significativos enquanto cursava e já em 1845, participa pela primeira vez nas exposições anuais de Brera. GEROLAMO INDUNO - Batalha de Cernaja - Óleo sobre tela - 1857 GEROLAMO INDUNO - A Batalha de Magenta - Óleo sobre tela Os irmãos Induno não nasceram num momento muito propício do ponto de vista político e social da Itália. Uma série de acontecimentos, envolvendo conflitos e guerras, levariam os dois a participações obrigatórias em campos de batalha. Em 1848, começam esses conflitos em suas vidas, tendo sido forçados ao exílio em Ticino. Voluntários dos movimentos que aconteciam em sua região, em 1849 se viram mais uma vez forçados na defesa da República Romana contra o exército francês. GEROLAMO INDUNO - O retorno do campo de batalha Óleo sobre tela - 96 x 78,3 - 1869 GEROLAMO INDUNO - O retorno do campo de batalha, detalhe A guerra também fez parte da vida artística de Gerolamo, que a ilustrou; tanto em campos de batalha, com incursões ao vivo; como em ateliê, quando abordava os estudos de campo de uma maneira mais elaborada. Até o início da década de 1850, grande parte da produção de Gerolamo estava diretamente ligada a esses movimentos. Ilustrador, e considerado como uma espécie de repórter de sua época, foi um dos mais destacados artistas de guerra italianos, responsável por aquilo que ficou caracterizado como artistas do Risorgimento. GEROLAMO INDUNO - O garibaldino - Óleo sobre tela - 1871 GEROLAMO INDUNO - Garibaldi sulle alture di Sant’Angelo presso Capua Óleo sobre tela - 64,5 x 52 Por causa de ferimentos de guerra, sofridos em conflitos em Roma, Gerolamo teve um período de descanso nos anos de 1850. Refugiou no ateliê do irmão, retornando a Milão, com a ajuda do Conde Giulio Litta, que além de um aristocrata de ideias liberais fervorosas, era também um colecionador de arte apaixonado. Ele já era cliente de Domenico e tornava agora uma espécie de mecenas e incentivador da arte de Gerolamo. Esquerda: GEROLAMO INDUNO - A pintora - Óleo sobre tela - 52,5 x 42 - 1873 Direita: GEROLAMO INDUNO - A pintora - Óleo sobre tela - 51 x 43,3 Foi graças a essa reclusão obrigatória, que Gerolamo teve mais tempo para se dedicar àquilo que tornaria o carro-chefe de sua produção: as cenas de gênero. Em trabalhos que prezaram sempre pela vida comum e suas lidas diárias, bem como as rotinas dos campos de batalha, sua carreira ia se solidificando, e a conquista de novos clientes começava como algo natural e promissor. É importante destacar, que o gosto por este tema de pintura era uma influência direta de seu irmão. GEROLAMO INDUNO - O pintor de imagens - Óleo sobre tela - 47 x 36 GEROLAMO INDUNO - O tocador de bandolim - Óleo sobre tela Mas, nem tudo era calmaria na vida de Gerolamo. Novos rumos da vida política de sua região o levaram mais uma vez a participações em guerras e conflitos, tendo servido a Guerra da Criméia entre 1854 e 1855. Em 1859, alistou-se nos Caçadores dos Alpes. Se por um lado essas interferências lhe tiravam da vida comum, por outro, traziam uma experiência diferenciada, pois a rotina da guerra o deixava ainda mais em contato com a arte própria desse tipo de conflito. Principalmente entre os anos de 1860 e 1863, os trabalhos de Gerolamo foram quase que todos absorvidos pela arte de guerra. Graças a ele, muito do que se registrou naquele período chegou a nossos tempos como uma espécie de noticiário dos acontecimentos. E isso o deixava ainda mais respeitado e requisitado por diversos colecionadores e instituições. GEROLAMO INDUNO - Quando o trem vem - Óleo sobre linho - 109,5 x 93 - 1871 GEROLAMO INDUNO - Quando o trem vem, detalhe A vida de Gerolamo encaminhava assim: os comissionamentos de temas ligados à guerra consumiam a maior parte de seu tempo, comissionamentos de obras públicas também começavam a aparecer com mais frequência e os trabalhos paralelos com cenas de gênero nunca eram deixados de lado. Trabalhava intensamente, como tudo sempre foi muito intenso em sua vida. O respeito e a admiração pela sua produção já não era restrito a pequenos grupos. Seus trabalhos eram disputados por colecionadores e esperados em muitas mostras e exposições. GEROLAMO INDUNO - Menina depois de um ataque de bombas - Óleo sobre tela GEROLAMO INDUNO - Sentinela Óleo sobre cartão - 40 x 28 Continuou por toda a sua vida a produzir aquilo que lhe inspirava e lhe fazia feliz. Manteve sempre a técnica brilhante, com uma facilidade pictórica que impressionava a todos. Até o fim de seus dias, esmerava em suas obras com a mesma disposição de um iniciante, e se prestava aos detalhes de suas composições com o mesmo entusiasmo de quando aprendia com seu mestre. Continuou sempre fiel aos seus princípios e àquilo que o mantinha no mundo da arte. Muito mais que um artista competente, era um cidadão que abraçava as causas nacionalistas e as defendia como quem defende a vida. Depois de uma longa doença, Gerolamo faleceu a 19 de dezembro de 1890, na mesma cidade que nascera. GEROLAMO INDUNO - Soldados na Stevio Pass - Óleo sobre tela - 44,5 x 59,5 GEROLAMO INDUNO - Infantaria na Crimeia - Óleo sobre tela - 37,7 x 48 Hoje, Gerolamo Induno é preciso ser lembrado e respeitado como um artista de referência. Viveu numa época onde a fotografia ainda engatinhava e o artista se ocupava em registrar as coisas de seu mundo. Ele fez isso como poucos. Muito do que se sabe e viu dos movimentos libertários da Itália do século XIX, deve ao trabalho incansável de artistas como ele.
GUSTAVE DE JONGHE - Mãe com sua filha - Óleo sobre painel - 45,7 x 55,6 - 1865 GUSTAVE DE JONGHE - Mãe com sua filha - Detalhe No auge de sua carreira, Gustave de Jonghe teria sua vida artística interrompida abruptamente por uma hemorragia cerebral, tirando sua visão. Porém, toda uma carreira já havia sido construída e ele deixou o registro de uma obra impecável, bem feita em todos os sentidos. GUSTAVE DE JONGHE - Indiscretas - Óleo sobre tela - 29,1 x 21,2 pol GUSTAVE DE JONGHE - Hora de brincar - Óleo sobre tela - 17,3 x 22 pol - 1866 GUSTAVE DE JONGHE - Mulher num interior Óleo sobre tela - 65,4 x 48 Gustave Léonard de Jonghe nasceu na cidade belga de Kortrijk, a 4 de fevereiro de 1829. Filho de um outro pintor, o proeminente Jan Baptiste de Jonghe, recebeu dele as primeiras lições de arte. Foi o próprio pai quem o incentivou a continuar pelo caminho da pintura, matriculando-o na Academia Real de Belas Artes, em Bruxelas. Ali, teve ensino direcionado por um dos principais artistas belgas daqueles tempos, o pintor François-Joseph Navez. No ambiente acadêmico, teve uma grande amizade com o artista Louis Gallait, que era especialista em pintura histórica. Quando fez 15 anos, seu pai faleceu e ele só pode continuar seus estudos graças a uma bolsa concedida pelos administradores de sua cidade natal. GUSTAVE DE JONGHE - Olhando para o tempo Óleo sobre painel - 65 x 62 GUSTAVE DE JONGHE - Um momento de distração Óleo sobre painel - 46 x 38 - 1868 GUSTAVE DE JONGHE - O recital - Óleo sobre painel - 55,5 x 45,5 As primeiras participações públicas com suas obras viriam acontecer à partir do ano de 1848, quando Gustave de Jonghe começaria a participar do Salão de Bruxelas. De Jonghe começou a trabalhar em Paris e fez isso pela primeira vez em 1850, exibindo no prestigiado Salon de Paris. Em 1855, ele se mudou da Bélgica para Paris e exibiu regularmente no Salão durante os próximos trinta anos. O Salão de Paris o premiou com uma medalha de terceiro lugar em 1863 e, nesse mesmo ano, recebeu uma medalha em Amsterdã. As honras aumentaram em 1864, quando o rei belga o chamou de Chevalier de l'Ordre de Leopold (Cavaleiro da Ordem de Leopold). GUSTAVE DE JONGHE - O recital - Óleo sobre painel - 11,5 x 9,2 pol GUSTAVE DE JONGHE - Doces sonhos - Óleo sobre painel - 73,2 x 54,5 GUSTAVE DE JONGHE - Mulher com uma rosa - Óleo sobre painel - 85 x 59 Seus primeiros trabalhos exploraram temas históricos e religiosos, como a composição dos Peregrinos, de 1854 (Museu Real de Belas Artes da Bélgica). Ele então mudou para a pintura de retratos e cenas de gênero e a paisagem ocasional. Ele trabalhou em óleo e às vezes em aquarela. Suas pinturas de retratos mostravam o estilo de vida dos habitantes da cidade, com seus modos contemporâneos elegantes. Esta foi uma tendência iniciada pelo pintor belga Alfred Stevens, no final da década de 1850 e depois seguida por outro pintor belga, Charles Baugniet, pelo francês Auguste Toulmouche e pelo próprio de Jonghe. No final da década de 1860, havia um mercado pronto para cenas de gênero com figuras burguesas, geralmente jovens glamorosas, em um ambiente luxuoso. Com o início da Belle Epoque na década de 1870, esse tipo de pintura que retratava mulheres bem vestidas em um interior, tornou-se popular no Salão de Paris. GUSTAVE DE JONGHE - Preparando para o baile - Óleo sobre tela GUSTAVE DE JONGHE - Tempo de diversão - Óleo sobre painel - 45,7 x 55,2 GUSTAVE DE JONGHE - Uma lição de bordado - Óleo sobre painel - 44,45 x 55,25 - 1864 Gustave de Jonghe pintou muitas cenas de mães com seus filhos (geralmente meninas) em ambientes íntimos. Através da escolha de pose, roupas e configuração, de Jonghe caracterizou o tipo de pessoa representada. Suas cenas visavam evocar as alegrias silenciosas da vida familiar entre a próspera burguesia daqueles tempos. GUSTAVE DE JONGHE - Uma fã japonesa - Óleo sobre tela - 1865 GUSTAVE DE JONGHE - No salão - Óleo sobre painel - 73 x 54 GUSTAVE DE JONGHE - Meditação - Óleo sobre tela Sua obra reflete gostos contemporâneos na arte, como a mania japonesa da segunda metade do século 19, com o seu interesse em arte e artefatos japoneses. Há obras que representam cenários completamente inspirados na decoração em estilo japonês, com modelos vestidas a rigor. Gustave de Jonghe também pintou algumas composições orientalistas como A sesta da tarde (também chamada de Odalisca reclinável), que refletiu o interesse contemporâneo no tema do harém e do Orientalismo. GUSTAVE DE JONGHE - A convalescente - Óleo sobre tela GUSTAVE DE JONGHE - Uma tarde de visitas - Óleo sobre tela GUSTAVE DE JONGHE - Repouso da tarde - Óleo sobre tela - 91 x 71 - 1875 Na década de 1870, o artista cruzou repetidamente entre Paris e Bruxelas. O início da cegueira, em 1882, após uma hemorragia cerebral, pôs fim em sua carreira artística e ele voltou para Bruxelas. Os principais artistas belgas e franceses, em Paris, organizaram uma venda de arte de caridade para apoiar o artista enfermo e sua família. Em 1884, ele se mudou para Antuérpia, onde morreria a 28 de janeiro de 1893. GUSTAVE DE JONGHE - Caminhadas amorosas - Óleo sobre tela GUSTAVE DE JONGHE - Uma tarde preguiçosa - Óleo sobre tela Embora hoje, alguns de seus trabalhos possam ser encontrados em museus internacionais, como d’Orsay (Paris) e Hermitage (São Petersburgo), a maior parte de seus trabalhos encontra-se mesmo em coleções particulares. Todos os anos, alguns raros trabalhos de sua autoria ainda são oferecidos nas mais prestigiadas casas de leilões do mundo. Ficou para o nosso tempo, o registro de um artista que soube explorar as oportunidades temáticas comerciais de sua época, mas que soube, acima de tudo, fazer isso com bom gosto e sinceridade. Uma prova de que é possível fazer arte ao gosto da clientela e que satisfaça ao seu executor. GUSTAVE DE JONGHE - A carta de consolo - Óleo sobre tela GUSTAVE DE JONGHE - A carta de consolo - Detalhe
HEINRICH VON ZÜGEL - Fazendeiro com vacas no portão - Óleo sobre tela - 60 x 84 HEINRICH VON ZÜGEL - Alguns animais no pasto Óleo sobre tela - 45 x 60,5 - 1941 Encontrar novidades do mundo da arte, aqui na rede, tem sido uma atividade bem comum ultimamente. Diversos artistas, de diversas partes do mundo, despejam diariamente inúmeras informações e imagens que tem formado uma idéia precisa e abrangente do atual cenário artístico mundial. Tão importante quanto nos mantermos informados a respeito das novidades que surgem por todos os lados, é também encontrarmos inúmeras referências e arquivos que dêem uma melhor noção do cenário artístico de outras épocas, bem anteriores à nossa. São esses dados, encontrados na paciência da procura e ordenados de maneira, às vezes bem pessoal, que nos permitem posicionar com mais clareza a trajetória do surgimento de estilos, tendências, bem como os artistas mais influentes de períodos bem diversos. HEINRICH VON ZÜGEL - Cabras Óleo sobre tela - 53,5 x 80,7 - 1900 HEINRICH VON ZÜGEL - Animais no pasto - Óleo sobre tela - 119,5 x 190 - 1906 HEINRICH VON ZÜGEL - Ovelhas Óleo sobre tela Cabe a cada um de nós, divulgar e socializar algumas injustiças que o tempo insiste em oferecer para certos trabalhos e artistas. Caso do alemão Heinrich Von Zügel, considerado um dos mais prestigiados pintores de animais do seu tempo e praticamente caído no esquecimento em tempos atuais. Não só pelo excelente volume de obras que produziu, mas principalmente por ter desenvolvido um trabalho que influenciou seguramente muitas escolas de sua geração, mesclando realismo, impressionismo e tendências quase expressionistas ao que executava. HEINRICH VON ZÜGEL - Duas vacas - Óleo sobre tela - 48,5 x 70,5 - 1904 À esquerda: HEINRICH VON ZÜGEL - Cabeça de veado - Óleo sobre tela À direita: HEINRICH VON ZÜGEL - Levando o gado - Óleo sobre tela Heinrich Von Zügel nasceu em Murrhardt, a 22 de outubro de 1850 e faleceu em Munique, a 30 de janeiro de 1941. Teve uma brilhante carreira, quase toda sedimentada em cima da temática de animais, geralmente domésticos, especialmente bovinos e ovinos, certamente pela influência de sua ascendência rural, pois era filho de pastores. HEINRICH VON ZÜGEL - Animais no cocho - Óleo sobre tela - 33,9 x 72,6 - 1941 HEINRICH VON ZÜGEL - Arando Óleo sobre tela HEINRICH VON ZÜGEL - Levando os animais Óleo sobre tela - 47 x 65 - 1941 Formou-se pela Escola de Stuttgart em 1869 e mais tarde passou uma temporada em Viena, porém retornando a Munique, logo em breve. Estudos ao ar livre, realizados em fazendas de terras altas em Dachau, foram fundamentais na década de 1880. Já em 1883, foi condecorado com medalha de ouro na Exposição Mundial em Viena. Tal fato lhe abriu caminho para que importantes museus da Europa adquirissem obras suas para seus acervos, ainda nessa década. HEINRICH VON ZÜGEL - Ovelhas - Óleo sobre tela - 70 x 92 HEINRICH VON ZÜGEL - Encontro no campo Óleo sobre tela - 60,5 x 80 HEINRICH VON ZÜGEL - Na estrada para Wolkenhof Óleo sobre tela - 46,5 x 60 - Cerca de 1941 Em 1890, a descoberta do Impressionismo, nas costas holandesa e belga, deu um novo alento e dinamismo para as obras do artista. A reprodução dos animais não era apenas uma transposição daquilo que era visto para as telas, mas uma preocupante captação de efeitos atmosféricos, principalmente da luz. Igual preocupação passou a dar aos efeitos de reflexos na água e às composições, como uma sensação de conjunto. HEINRICH VON ZÜGEL - Animais no curral Óleo sobre tela - 80,5 x 110 - 1910 HEINRICH VON ZÜGEL - Ovelhas - Óleo sobre tela - 1897 HEINRICH VON ZÜGEL - Um dia frio Óleo sobre tela - 58 x 95 - 1905 Tornou-se professor na Academia de Belas Artes de Munique no ano de 1895 e aí lecionou até o ano de 1922, quando se aposentou. Teve alunos influentes como Otto Dill, Emanuel Hegenbarth, Julius Paul Junghanns, Christian Schad e Philip Erlanger. Mesmo em sua velhice, produziu obras impressionistas de uma fantástica leveza e intenso frescor. Trabalhou mais de quarenta anos em cima de sua temática, que dominava como ninguém. Juntamente com Lovis Corinth, Max Liebermann e Slevegot, Heinrich é considerado um dos grandes nomes do impressionismo alemão. À esquerda: HEINRICH VON ZÜGEL - Camponesa com gado - Óleo sobre tela - Cerca de 1920 À direita: HEINRICH VON ZÜGEL - Deixando o estábulo - Óleo sobre tela - 53 x 40 - 1917 Abaixo: HEINRICH VON ZÜGEL - Veado abatido em caça - Óleo sobre tela - Cerca de 1911 Heinrich Von Zügel tem um significado especial para a cidade de Worth, pois é para lá que seus discípulos eram levados a passar férias e onde produziram muitas obras ao ar livre. Mesmo que não fossem precursores de um movimento que se tornou um dos mais importantes da História da Arte, muitos artistas europeus continuaram a desenvolver e praticar o Impressionismo por um longo período, seja imortalizando cenas rurais ou urbanas, comprometidos unicamente com a proposta mais importante do estilo, captar efeitos. HEINRICH VON ZÜGEL - O arado Óleo sobre tela HEINRICH VON ZÜGEL - Animais à sombra - Óleo sobre tela - 1919 HEINRICH VON ZÜGEL - Pequeno pastor com três vacas Óleo sobre tela - 36 x 51 Zügel é um daqueles exemplos onde a determinação e a convicção de um estilo e tema definidos, fazem de um artista um colaborador indispensável para a memória cultural da humanidade. Preservar essa memória não é apenas acumular dados, mas disponibiliza-la em benefício de um mundo melhor. HEINRICH VON ZÜGEL - Autorretrato Óleo sobre tela - 1927
LARS JUSTINEN - Inspiração “O mais belo triunfo do escritor é fazer pensar os que podem pensar.” Eugène Delacroix (Saint-Maurice-França 1798-1863 Paris-França) Considero três, as principais conquistas do homem. O fogo, a roda e a escrita. Quando souberam produzir e dominar o fogo, nossos ancestrais não só se protegeram e aqueceram nas noites frias, como também aprenderam a cozinhar e assar os seus alimentos. E isso aumentou, e muito, a variedade do cardápio. A roda fez o homem encurtar distâncias e multiplicar suas tecnologias. Desde uma simples roda d’água, que movimentava moinhos, até instrumentos importantes como a máquina de fiar (roca) e as complexas engrenagens, os frutos mais sofisticados na Revolução Industrial. Mas é a escrita, a maior de todas as conquistas. WINSLOW HOMER - Luz da manhã e sombra Óleo sobre tela - 1872 “Dupla delícia: o livro traz a vantagem de a gente poder estar só e ao mesmo tempo acompanhado.” Mário Quintana (Alegrete-RS 1906-1994 Porto Alegre-RS) Todos os historiadores são unânimes em afirmar que a escrita foi a única habilidade que nos tornou completamente diferentes dos outros animais. É na complexidade da língua, codificada em símbolos, que o homem ascendeu ao padrão sapiens, que significa saber, ter consciência de algo e dominar aquilo que se pensa, tanto que é o fator divisor entre a pré-história e a história, no decorrer de nossas civilizações. WILLIAM BOUGUEREAU - A difícil lição Óleo sobre tela - 97,8 x 66 - Coleção particular “É o que você lê quando não tem que fazê-lo que determinará o que você será quando não puder evitar.” Oscar Wilde (Dublin-Irlanda 1854-1900 Paris-França) A escrita é como uma foto de nossas idéias. Estou longe de todos vocês nesse instante, mas vocês acompanham comigo, no caminhar de cada linha, todas as cenas e situações que estou propondo em minhas palavras. E se elas são diretas e conexas, consigo explicar, até com mais clareza, certas idéias que não faria pessoalmente. São poucos símbolos que ao embaralharem e se ajuntarem, transformam-se nessa rica mistura de palavras, frases, textos, livros... ARCIMBOLDO - O bibliotecário 1566 - Stkklosters Slott, Estocolmo “Ler é beber e comer. O espírito que não lê emagrece como um corpo que não come.” Victor Hugo (Besançon-França 1802-1885 Paris-França) Quando a escrita ganhou as primeiras vogais, ainda no alfabeto grego, Sócrates temia que um grande desastre abateria sobre a humanidade. Para ele, a palavra falada era a forma mais segura de atingir um verdadeiro questionamento. Temia, por isso, que os jovens de sua época, encantados com a escrita, perdessem o hábito de questionar e que portanto não exercitassem mais suas memórias em uma boa roda de conversas, pautadas por diálogos, retóricas e discursos. Felizmente ele se enganou, e o mundo pode assimilar a maior de todas as transformações culturais. Estamos atravessando, nesse momento, algo parecido com o que aconteceu há cerca de 2500 anos. Uma mudança cultural. Da cultura escrita para a cultura digital e visual. Até bem pouco tempo, a forma física do texto era um suporte escrito com algum tipo de tinta, desde os papiros do antigo Egito até bem recente, no melhor papel impresso na impressora mais avançada. Agora temos o livro eletrônico, que oferece experiências que vão muito além de um deleite da companhia de um bom livro, mas tem também recursos visuais e táteis inimagináveis até bem pouco tempo atrás. TOM BROWNING - Lições Óleo sobre painel - 30,5 x 40,6 “Os livros são os mais silenciosos e constantes amigos; os mais acessíveis e sábios conselheiros; e os mais pacientes professores.” Charles W. Elliot (Boston-Estados Unidos 1834-1926 Northeast Harbor-Estados Unidos) É uma pena que os hábitos da escrita, e principalmente da leitura, estejam perdendo forças. Existem atalhos demais para a comunicação. Códigos, gírias, expressões que se agrupam em pouquíssimos símbolos. Uma linguagem que absorve nossa essência sapiens e nos habilita progressivamente, a uma linguagem de máquinas. Há um perigo constante, na nova onda digital que entramos, da abundância de informações com demasiados apelos visuais e sonoros, que dispersam uma profunda leitura e informem apenas aquilo que é superficial, muitas vezes banal e que nada acrescente. Por todos os lados, engrossa cada vez mais a parcela dos analfabetos funcionais, pessoas que aprenderam a linguagem dos símbolos, mas não continuaram o diálogo com eles. Desacostumaram, no correr dos dias, a ouvir, pronunciar, sentir a musicalidade que exala das frases que compõe a nossa vida, que expressam o que somos e o que queremos. TEIXEIRA DA ROCHA - Cena de interior Óleo sobre madeira - 53,5 x 32,5 - Coleção Fadel “Quem não vê bem uma palavra, não pode ver bem uma alma.” Fernando Pessoa (Lisboa-Portugal 1888-1935 Lisboa-Portugal) A encruzilhada na qual estamos tem uma semelhança muito grande com o futuro temido por Sócrates. O caminho que iremos escolher é algo ainda bastante incerto. Algumas poucas iniciativas tentam resgatar o muito do que se tem perdido. É preciso louvar e reverenciar iniciativas defendidas por atos isolados, de entidades ou até mesmo pessoais, na luta contra a ignorância que abraça o mundo. Somos todos responsáveis e muitas vezes esquecemos disso. ALMEIDA JÚNIOR - Repouso Óleo sobre tela - 85 x 115 Coleção particular, Rio de Janeiro “É ainda possível chorar sobre as páginas de um livro, mas não se pode derramar lágrimas sobre um disco rígido.” José Saramago (Azinhaga-Portugal) Vou deixar alguns endereços que descobri pela rede, um veículo que fala a linguagem de um novo tempo. Não temos que evitar novas maneiras de expressar, só precisamos apenas, saber utiliza-las. www.dominiopublico.gov.br www.bn.br www.oquecintilaemmim.blogspot.com www.macariocampos.blogspot.com www.cgi.br/gt/gtbv/bibliotecas.htm “O Livro Desconhecido Estou à procura de um livro para ler. É um livro todo especial. Eu o imagino como a um rosto sem traços. Não lhe sei o nome nem o autor. Quem sabe, às vezes penso que estou à procura de um livro que eu mesma escreveria. Não sei. Mas faço tantas fantasias a respeito desse livro desconhecido e já tão profundamente amado. Uma das fantasias é assim: eu o estaria lendo e, de súbito, uma frase lida com lágrimas nos olhos, diria em êxtase de dor e de enfim libertação: mas é que eu não sabia que se pode tudo, meu Deus!” Clarice Lispector (Tchechelnik-Ucrânia 1920 - Rio de Janeiro-RJ - 1977)
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COLUMBANO - O Grupo do Leão Óleo sobre tela, 200 x 380 Sentados, da esquerda para a direita: Henrique Pinto, José Malhoa, João Vaz, Silva Porto, Antônio Ramalho, Moura Girão, Rafael Bordalo Pinheiro e Rodrigues Vieira. De pé, da esquerda para a direita: Ribeiro Cristino, Alberto d'Oliveira, Manuel Fidalgo (empregado de mesa), Columbano, Dias (criado), Antônio Monteiro e Cipriano Martins. Ao longo da História da Pintura, artistas sempre se organizaram e defenderam sensos estéticos que tivessem uma ótica parecida. Foi assim com a Escola de Barbizon, a Escola do Rio Hudson, os do Grupo Macchiaiolio, Impressionistas, Nabis... Dividiam os mesmos temas, técnicas e desenvolviam quase sempre uma nova proposta ou jeito de ver e fazer novos trabalhos. Também não foi diferente com o Grupo do Leão, movimento significativo que revolucionou a História da Pintura em Portugal. SILVA PORTO - Na cisterna Óleo sobre tela, 42,5 x 56,5 MARQUES DE OLIVEIRA - À espera dos barcos Óleo sobre tela, 77,5 x 97 Entender as propostas e desafios enfrentados pelo Grupo do Leão, requer situar primeiramente em que contexto histórico ele veio a se formar. É a condição na qual se encontrava o país, o principal fator para os objetivos do grupo. Lá pela metade do século XIX, Portugal ainda sofria grandes traumas pela saída da família real portuguesa, desde sua ida para o Brasil, no início do século. Não bastasse a grande ausência da corte, veio a seguir, a perda da colônia brasileira e uma guerra civil massacrante, que durante longos anos, fez confrontar absolutistas e liberais. Em meio a esse caos aparente, o país tenta ressuscitar modernizando o máximo possível. Algumas primeiras iniciativas no parque industrial e comercial, e uma dinamização na agricultura, chegaram até a produzir um significativo efeito. Obras públicas como a inauguração da primeira via férrea, bem como a melhoria de estradas e pontes ganharam até um nome: Fontismo, em homenagem ao nome do ministro que as promoveu, Fontes Pereira de Melo. Ainda que muitos imprevistos tenham prejudicado o pleno êxito dessas iniciativas, o país consegue um certo progresso, mas, um pouco acanhado se comparado ao resto do continente. Há um êxodo rural significativo e cidades como Lisboa e Porto chegam a ter população e áreas dobradas já no final do século XIX. Até os movimentos culturais do país parecem estar em descompasso com o turbilhão de novidades que vivia o resto da Europa. MALHOA - Os bêbados Óleo sobre tela, 150 x 200 CARLOS REIS - O batizado Óleo sobre tela, 130 x 166 ARTHUR LOUREIRO - Campina romana Óleo sobre tela, 81 x 146,5 Em 1879, Antônio Silva Porto assume a docência da cadeira de Paisagem na Academia Real de Belas-Artes, em Lisboa, e promove o que talvez tenha sido uma das maiores revoluções artísticas do país: o Naturalismo. Silva Porto, juntamente com seus alunos e seguidores, reuniam constantemente na cervejaria Leão d’Ouro, na Rua Primeiro de Dezembro. Ficaram, por isso, conhecidos como o Grupo do Leão. SILVA PORTO - Ceifeiras Óleo sobre tela, 90,5 x 120,3 MALHOA - Músicos em dia de festa Óleo sobre tela Como e por que Silva Porto abraçou esta proposta? Voltando um pouco mais na história desse artista, sabemos que ele, juntamente com João Marques de Oliveira, foram enviados a Paris como bolsistas do Estado. À procura de base acadêmica, a que eram enviados todos os estudantes de arte que desembarcavam em Paris, os estudos desses jovens artistas portugueses começaram a ganhar maior influência de uma nova tendência que atraía muitos adeptos: o círculo de artistas liderados por Charles Daubigny. Considerado o fundador da Escola de Barbizon, uma pequena aldeia que ficava nos arredores da floresta de Fontainebleau, Daubigny incutia nos seus discípulos a prática de um paisagismo que se empenhava muito mais em captar os efeitos da luz do que registrar pormenores dos motivos representados. Isso seria levado a conseqüências muito mais concretas e audaciosas com os Impressionistas, que tiveram influência evidente da Escola de Barbizon, até porque viviam e expunham seus trabalhos na mesma época. Silva Porto e Marques de Oliveira tiraram boas lições dessa fase, não só fixando nos ensinamentos de Daubigny, como se abrindo a outros experimentos, como os que fazia Millet, que além da proposta naturalista, povoava suas telas com camponeses realistas e sofridos. Mas, os jovens artistas foram também até a Itália. Em Roma, Marques de Oliveira se especializa na pintura histórica, para a qual ganhou sua bolsa, e Silva Porto vai mais ao sul, fixando estadia em Capri. Sob a forte luz do Mediterrâneo, muito mais brilhante que os tons soturnos da sua estada em Paris, ele muda consideravelmente sua paleta. SILVA PORTO - A volta do mercado Óleo sobre tela, 114 x 151 ANTÔNIO RAMALHO - O lanterneiro Óleo sobre tela, 106 x 87 JOÃO VAZ - No Tejo Óleo sobre tela, 94 x 152 Já de volta a Portugal, quando recebe o convite para a cadeira de Paisagem, Silva Porto não é apenas um pintor com influências de Barbizon, é também um eclético artista, com variadas combinações brilhantes e bem distintas, conseqüência dos aprendizados que praticara na Itália. O que viria direcionar Silva Porto ao Naturalismo, é a busca constante, em sua obra, de uma temática voltada sempre ao campo. O que ele fez, não foi buscar um tema idílico e imaginário. Muito pelo contrário, apenas abriu os olhos para o ritmo lento e atrasado do processo de desenvolvimento português. Para ele e todos os que se deixaram guiar por ele, a temática se tornara quase uma lei. É na vida das aldeias que residia a verdade mais pura de sua época e de seu país. Nascia ali, a grande saga do maior movimento artístico português. MALHOA - A sesta Óleo sobre madeira, 32,5 x 41 SOUSA PINTO - Le baquet bleu Óleo sobre tela, 77 x 61 MALHOA - Cócegas Óleo sobre tela, 218,5 x 285 Mesmo surgindo tardiamente nas terras portuguesas e partindo do modelo influenciado nos aprendizados de Barbizon, o Naturalismo português viria a se desenvolver de forma original, colocando-se entre uma das mais importantes escolas naturalistas mundiais. O que mais marcou o ensino do mestre Silva Porto não eram as enfadonhas aulas teóricas. Ele e seus alunos juntavam os cavaletes e partiam para o campo, fazendo dessa atividade a base prioritária do movimento. Era ali, que durante tempos a fio, ficavam a representar incansavelmente lugares previamente escolhidos. Captavam o vigor da luz, os verdes e amarelos da vegetação, os ocres avermelhados do solo português e os tons cinzas e azulados da atmosfera. À partir daí, se trancavam nos ateliers nos meses de inverno e outono, e transformavam esses estudos, muitas vezes dinâmicos e liberais, em composições um pouco mais disciplinadas que viessem agradar a público e crítica. Esse foi, certamente, o ponto mais negativo da grande proposta que sugeria Silva Porto. Por adequar a um gosto mais provinciano e de poucos horizontes, o Naturalismo português caiu na velha receita acadêmica, contra a qual lutavam muitos outros movimentos pela Europa. Prova disso, é que hoje os estudos livres e despojados de ar livre, feitos por todos os naturalistas portugueses que saiam a campo, sejam vistos com maior empenho por colecionadores e galerias. HENRIQUE PINTO - A saída do rebanho Óleo sobre madeira, 40,5 x 31,6 SOUZA PINTO - Mulher bordando Pastel sobre papel, 32 x 22,3 SILVA PORTO - Barcos ancorados Óleo sobre tela Independente de terem colaborado ou não para a grande revolução pictórica que a Europa assistiu nos anos finais do século XIX, nunca houve em Portugal, uma pintura tão popular como a dos Naturalistas. E, mesmo que acanhados, se comparados às propostas ousadas de Monet e sua turma, os naturalistas ganharam títulos e pompas de “modernistas” para sua época. Além de Silva Porto e Marques de Oliveira, é inegável o destaque de outros dois componentes do grupo: Columbano Bordalo Pinheiro e José Malhoa. Há quem diga que os dois até transcenderam seus mestres. CARLOS REIS - Paisagem do Rio Almonda Pastel sobre cartão, 54 x 74 MALHOA - A curar a roupa Óleo sobre tela, 63 x 75 SILVA PORTO - Recanto de praia Óleo sobre madeira, 31,5 x 54,5 Columbano foi o mais atípico desse grupo. Averso que era ao exercício natural, dava-se mais ao retrato, e é dele a famosa tela do grupo, em momento de confraternização na cervejaria. De cores muito bem trabalhadas em incansáveis veladuras, era dono ainda de uma paleta com grande sutileza de matizes. Retratou não só todos os amigos pintores, como todos os mais importantes vultos da sociedade portuguesa daquela época. Com todos os méritos, Malhoa foi sem dúvida, o mais popular e querido dos pintores portugueses. Era ele o artista que encarnou com maior vitalidade, a linguagem que representou a realidade de um país. Conseguiu uma organização plástica que não diminuía, mas, que exaltava de uma forma positiva todo o atraso cultural e revolucionário de uma nação em relação ao resto do continente. A extrema pobreza e os costumes tão primitivos e aparentemente pequenos, ganham em suas obras uma grandiosidade incomparável. E faz isso com largas pinceladas, abusivas e bem colocadas texturas, guiando a luz com uma magistral competência. MALHOA - O fado Óleo sobre tela, 150 x 183 SILVA PORTO - Guardando o rebanho Óleo sobre tela, 160 x 200 HENRIQUE PINTO - Entre o milharal Óleo sobre tela, 135 x 94 Outros artistas se despontaram bem rápido com o Naturalismo. São muito bem elaboradas e representadas as marinhas de João Vaz, feitas com pinceladas espontâneas e conseguindo uma atmosfera bem convincente para as águas e seus reflexos. Antônio Ramalho se destaca nos retratos, mas, ainda dentro da proposta naturalista, tem uma diversificada temática paisagística. No Porto, Marques de Oliveira desempenha o mesmo papel desenvolvido em Lisboa, por Silva Porto. Em sucessivas gerações de discípulos e seguidores, difundiu um paisagismo com grande qualidade, sempre tendo referências os ensinamentos dos tempos de Barbizon e suas vertentes mais modernas, como Corot. SILVA PORTO - Charneca de belas ao por do sol Óleo sobre tela, 85 x 150 SOUZA PINTO - Barco desaparecido Óleo sobre tela, 73 x 91 SILVA PORTO - No Areinho Óleo sobre madeira, 37,4 x 56 José Júlio de Souza Pinto foi o pintor naturalista português que mais tempo viveu no exterior, passando uma grande parte de sua vida e carreira na Bretanha, nunca deixando, porém, de ressaltar os laços com Portugal. Suas experiências em pastéis, que o habilitam como pintor hábil e técnico, são suas obras mais relevantes. Mesmo com uma paleta bem ousada e forte influência impressionista, o artista não se rende de todo a esse movimento. Fica a praticar obras de agrado ao público, ainda mais tendentes ao academicismo. Não que isso seja de todo um defeito, mas, o distancia um pouco da proposta mais vanguardista de muitos artistas de sua época. Arthur Loureiro teve também significativa relevância no movimento. Passou um longo período de sua vida na Austrália. Suas obras tendem a uma linguagem mais simbólica, parecendo às vezes, distanciar um pouco mais da proposta naturalista do grupo. AURÉLIA DE SOUSA - Cena de interior com mulher a coser Óleo sobre tela, 41 x 32 JOAQUIM LOPES - Sol da tarde, Veiga da Urgeira Óleo sobre tela, 59 x 80 MARQUES DE OLIVEIRA - Vista de praia com barcos e mulheres Óleo sobre madeira, 22,5 x 35 Uma das figuras de maior destaque na Segunda Geração dos Naturalistas Portugueses foi Carlos Reis. Teve como herança a pintura de gênero de Silva Porto, mas com um lirismo gestual influenciado por Malhoa. Insistente que foi na manutenção acadêmica de suas obras, foi perdendo um pouco o interesse do público, que já se abria aos novos movimentos do continente. Manuel Henrique Pinto dedicou-se quase esclusivamente à prática de paisagens. Era muito amigo e influenciado por Malhoa e teve em Figueiró dos Vinhos, a maioria dos palcos de suas obras. De vital importância ao movimento naturalista português, foi Alberto de Oliveira, incansável no seu trabalho de promoção do grupo. Rafael Bordalo Pinheiro, caricaturista e ceramista, foi um dos mais criativos artistas do final do século XIX, em Portugal. Viveu um período de conturbação política quando esteve no Brasil entre 1875 e 1879. Sua ligação com o Brasil teve longa história, mesmo colecionando desafetos pelas críticas e charges que muitas vezes ofendiam políticos e celebridades. MALHOA - Figura sentada a ler Óleo sobre tela colada sobre cartão, 26 x 31 FALCÃO TRIGOSO - Paisagem de rio com trigoso Óleo sobre tela, 81,5 x 110 ALFREDO KELIL - Vista da Guia com figuras Óleo sobre cartão, 23 x 35 A lista de artistas ligados ao movimento naturalista é grande. Vale citar nomes como Henrique Pousão, o Rei D. Carlos, Luciano Freire, Alfredo Kelil e a pintora Aurélia de Sousa. Também se fazem presentes Moura Girão, Rodrigues Vieira, Ribeiro Cristino, Alberto d’Oliveira, Falcão Trigoso, Joaquim Lopes, Antônio Monteiro, Cipriano Martins e muitos outros, que mesmo não tendo expostos seus trabalhos nas coletivas do grupo, tiveram uma grande influência do Naturalismo em suas obras. Entre 1881 e 1889 foram realizadas 8 exposições dos chamados “naturalistas portugueses”, que alternaram participantes em muitas delas. MARQUES DE OLIVEIRA - Praia dos pescadores, Póvoa do Varzim Óleo sobre madeira, 22,5 x 35 CARLOS REIS - Lousã ao longe Óleo sobre tela,48,2 x 65,7 Ao mesmo tempo que mostrou ao mundo uma valiosa produção enquanto durou, o movimento Naturalista Português fez com que o país sofresse por seu caráter um tanto quanto bairrista. Durante todo o início do século XX, movimentos artísticos importantes se viram praticamente barrados em Portugal. Do Cubismo ao Expressionismo, passando pelo Futurismo e Arte Abstrata, todos eles não tiveram espaço por um longo tempo. Mas, não vale realçar tal equívoco. O que fizeram e significaram todos os artistas daquela época, estará merecidamente para sempre na História da Arte.
ARTHUR JOHN ELSLEY - Uma procissão real - Óleo sobre tela - 100,3 x 134,6 - 1894 ARTHUR JOHN ELSLEY - Uma mão amiga Óleo sobre tela - 96,5 x 71 - 1913 Nos períodos da Era Vitoriana e final da Era Eduardiana, um estilo tornou-se especial nas terras da Inglaterra: cenas de gênero com temática da vida doméstica, principalmente que retratassem crianças. Havia uma preferência por temas bem lúdicos, em que as crianças brincavam alegremente entre si ou com seus animais de estimação. Esse tipo de representação era tão requisitado, que não se restringia apenas a desenhos e pinturas. Logo, tornaram-se amplamente divulgados e vendidos como impressões, anúncios, calendários, livros e revistas. Vários artistas se especializaram nessa temática e um deles obteve êxito e sucesso explorando-a por quase toda a vida: Arthur John Elsley. ARTHUR JOHN ELSLEY - Colhendo maçãs Óleo sobre tela - 96,5 x 68,5 - 1919 ARTHUR JOHN ELSLEY - Well done - Óleo sobre tela - 108 x 153,7 - 1907 Elsley nasceu a 20 de novembro de 1860, em Londres, e foi um dos seis filhos do casal John Elsley e Emily Nee Freer. O gosto pela arte deve ter herdado do pai, que, além de cocheiro, era um artista amador, que teve uma carreira artística curta e não muito evidente, interrompida por uma doença que o impossibilitou para muitas atividades. Arthur John Elsley começou bem cedo. Há desenhos dele com apenas 11 anos, já retratando animais domésticos e animais que fazia nas visitas no zoológico em Regents Park. Aos 14 anos, matriculou-se na Kensigton School of Art, que viria a se tornar mais tarde o Royal College of Art. É dessa época também uma triste ocorrência. Contraindo sarampo naquele ano, teria sua visão danificada permanentemente. ARTHUR JOHN ELSLEY - A alegria da primavera - Óleo sobre tela - 92 x 117,4 - 1911 ARTHUR JOHN ELSLEY - Um empate Óleo sobre tela - 97,2 x 64,8 - 1893 Arthur John Elsley tinha como hábito pegar sua bicicleta e andar pelos campos vizinhos colhendo motivos que o inspirassem em suas composições. A vida no campo o seduzia e ele sabia fazer com isso seduzisse a outros também. Um quadro de um pônei velho, produzido em 1978, foi o único trabalho que seu pai chegaria a ver, pois faleceu um mês depois dele ser exposto na Academia Real. Elsley continuou seus estudos acadêmicos até 1882 e à partir daí começaram as diversas encomendas para pinturas de crianças, cavalos e cães. ARTHUR JOHN ELSLEY - Boa noite - Óleo sobre tela - 60 x 46 ARTHUR JOHN ELSLEY - Labaredas de dragão - Óleo sobre tela - 70,5 x 93,3 - 1894 O convívio com artistas como George Grenville Manton e Solomon Joseph Solomon abriu uma nova fase para Elsley. Com Solomon ele iria dividir um estúdio, em 1876 e ficaria ali até 1889, quando mudou-se para o estúdio de Frederick Morgan, que já era um renomado artista, com inúmeras encomendas para toda a aristocracia inglesa, principalmente de retratos. Elsley iria colaborar com a execução de pintura de animais, uma dificuldade para Morgan. Teve um período altamente produtivo e com louvores no meio acadêmico, recebendo premiações e condecorações. A boa fase lhe permitiu casar em 1893 e até a montar o seu próprio estúdio, logo a seguir. Mesmo em endereço diferente, ainda mantinha uma boa relação com Morgan. ARTHUR JOHN ELSLEY - De bem com a vida - Óleo sobre tela - 66 x 86 - 1910 ARTHUR JOHN ELSLEY - Amigo ou inimigo - Óleo sobre tela - 88,9 x 101,6 Após a morte de Charles Burton Barber, Elsley tornou-se seu natural sucessor como o mais importante pintor de crianças e animais de estimação. Tal reputação parece não ter agradado muito bem a Morgan, que o acusou de plagiar as suas ideias. Isso fez com Elsley se tornasse mais ousado, enriquecendo suas composições com vários personagens. Extraía seus modelos de estudos que realizava em seu próprio ateliê ou de imagens que colhia de revistas e periódicos. Sua visão, cada vez mais comprometida, sofria com seu trabalho. ARTHUR JOHN ELSLEY - Casa cheia Óleo sobre tela ARTHUR JOHN ELSLEY - Ele não vai feri-lo Óleo sobre tela - 91,4 x 71,1 - 1908 Com o início da Primeira Guerra Mundial, a produção de Elsley caiu drasticamente. Ele também se viu forçado a trabalhar em uma fábrica de munições, o que veio a prejudicar ainda mais a sua visão, já tão comprometida. No início da década de 1930, ele conseguia realizar apenas serviços simples na área de jardinagem e marcenaria. Ele faleceu em sua própria casa, em Tunbridge Wells, a 19 de fevereiro de 1952. ARTHUR JOHN ELSLEY - Uma pausa no jogo Óleo sobre tela - 114 x 86 - 1908 ARTHUR JOHN ELSLEY Um porquinho para vender no mercado Óleo sobre tela - 94,6 x 69,2 Suas obras foram reproduzidas em várias publicações, usadas comercialmente por diversas empresas, desde fábricas de biscoitos a lojas de costura e edições de calendários. No auge de sua carreira, que durou entre o período de 1878 a 1927, exibiu 52 obras na Academia Real, sendo que muitas delas ainda percorreram diversas galerias de toda a Grã-Bretanha. Seu trabalho encanta até hoje. ARTHUR JOHN ELSLEY - Na oficina - Óleo sobre tela
GEROLAMO INDUNO - O cumprimento - Óleo sobre tela - 85,3 x 126,5 - 1877 GEROLAMO INDUNO - A lição do baile - Óleo sobre tela - 107 x 135,5 A Itália sempre foi um berço nato de grandes artistas, em diversas épocas da história. Há quem diga que o ápice artístico italiano se deu no Renascimento, e isso tem lá suas verdades. Mas, a grandiosidade da pintura e escultura italianas não se resumiu somente a esse período. Os anos de 1800, que eles carinhosamente chamam de Ottocento, reservaram aos artistas italianos um período muito prolífico, de uma arte voltada para as coisas “de casa”, uma maneira de dizer que voltaram os olhos para uma arte mais intimista e nacionalista. Essa fase tornou-se também mais um grande período da arte italiana. GEROLAMO INDUNO - Donne romane, scena conteporanea - Óleo sobre tela - 76 x 101 - 1864 GEROLAMO INDUNO - Criança amada - Óleo sobre tela - 54,4 x 74 - 1871 Nesse período, é imprescindível falar dos artistas que desenvolveram uma arte acadêmica que é respeitada até hoje. Com vertentes que voltaram o olhar para o Realismo e o Naturalismo, os trabalhos desse período nos revelam artistas donos de um domínio técnico admirado e com uma criatividade de composição invejáveis para qualquer época. Gerolamo Induno, entre muitos outros pintores italianos dessa época, é daqueles artistas que a história precisa relembrar e cujas obras necessitam tornar referência para os tempos atuais. GEROLAMO INDUNO - A partida dos voluntários de 1966 (estudo) Óleo sobre tela - Entre 1877 e 1878 GEROLAMO INDUNO - A partida dos voluntários - Óleo sobre tela Gerolamo Induno nasceu em Milão, a 13 de dezembro de 1825, filho mais novo de Marcos e Julia Somaschi. A arte o acompanhou desde cedo, até porque o seu irmão, Domenico Induno, dez anos mais velho que ele, começou prematuramente nas artes e tornou-se uma referência natural sua. Ambos estudaram na Academia Brera, sob os ensinamentos de Luigi Sabatelli. Gerolamo ficaria naquela instituição entre 1839 e 1846. Conseguiu prêmios significativos enquanto cursava e já em 1845, participa pela primeira vez nas exposições anuais de Brera. GEROLAMO INDUNO - Batalha de Cernaja - Óleo sobre tela - 1857 GEROLAMO INDUNO - A Batalha de Magenta - Óleo sobre tela Os irmãos Induno não nasceram num momento muito propício do ponto de vista político e social da Itália. Uma série de acontecimentos, envolvendo conflitos e guerras, levariam os dois a participações obrigatórias em campos de batalha. Em 1848, começam esses conflitos em suas vidas, tendo sido forçados ao exílio em Ticino. Voluntários dos movimentos que aconteciam em sua região, em 1849 se viram mais uma vez forçados na defesa da República Romana contra o exército francês. GEROLAMO INDUNO - O retorno do campo de batalha Óleo sobre tela - 96 x 78,3 - 1869 GEROLAMO INDUNO - O retorno do campo de batalha, detalhe A guerra também fez parte da vida artística de Gerolamo, que a ilustrou; tanto em campos de batalha, com incursões ao vivo; como em ateliê, quando abordava os estudos de campo de uma maneira mais elaborada. Até o início da década de 1850, grande parte da produção de Gerolamo estava diretamente ligada a esses movimentos. Ilustrador, e considerado como uma espécie de repórter de sua época, foi um dos mais destacados artistas de guerra italianos, responsável por aquilo que ficou caracterizado como artistas do Risorgimento. GEROLAMO INDUNO - O garibaldino - Óleo sobre tela - 1871 GEROLAMO INDUNO - Garibaldi sulle alture di Sant’Angelo presso Capua Óleo sobre tela - 64,5 x 52 Por causa de ferimentos de guerra, sofridos em conflitos em Roma, Gerolamo teve um período de descanso nos anos de 1850. Refugiou no ateliê do irmão, retornando a Milão, com a ajuda do Conde Giulio Litta, que além de um aristocrata de ideias liberais fervorosas, era também um colecionador de arte apaixonado. Ele já era cliente de Domenico e tornava agora uma espécie de mecenas e incentivador da arte de Gerolamo. Esquerda: GEROLAMO INDUNO - A pintora - Óleo sobre tela - 52,5 x 42 - 1873 Direita: GEROLAMO INDUNO - A pintora - Óleo sobre tela - 51 x 43,3 Foi graças a essa reclusão obrigatória, que Gerolamo teve mais tempo para se dedicar àquilo que tornaria o carro-chefe de sua produção: as cenas de gênero. Em trabalhos que prezaram sempre pela vida comum e suas lidas diárias, bem como as rotinas dos campos de batalha, sua carreira ia se solidificando, e a conquista de novos clientes começava como algo natural e promissor. É importante destacar, que o gosto por este tema de pintura era uma influência direta de seu irmão. GEROLAMO INDUNO - O pintor de imagens - Óleo sobre tela - 47 x 36 GEROLAMO INDUNO - O tocador de bandolim - Óleo sobre tela Mas, nem tudo era calmaria na vida de Gerolamo. Novos rumos da vida política de sua região o levaram mais uma vez a participações em guerras e conflitos, tendo servido a Guerra da Criméia entre 1854 e 1855. Em 1859, alistou-se nos Caçadores dos Alpes. Se por um lado essas interferências lhe tiravam da vida comum, por outro, traziam uma experiência diferenciada, pois a rotina da guerra o deixava ainda mais em contato com a arte própria desse tipo de conflito. Principalmente entre os anos de 1860 e 1863, os trabalhos de Gerolamo foram quase que todos absorvidos pela arte de guerra. Graças a ele, muito do que se registrou naquele período chegou a nossos tempos como uma espécie de noticiário dos acontecimentos. E isso o deixava ainda mais respeitado e requisitado por diversos colecionadores e instituições. GEROLAMO INDUNO - Quando o trem vem - Óleo sobre linho - 109,5 x 93 - 1871 GEROLAMO INDUNO - Quando o trem vem, detalhe A vida de Gerolamo encaminhava assim: os comissionamentos de temas ligados à guerra consumiam a maior parte de seu tempo, comissionamentos de obras públicas também começavam a aparecer com mais frequência e os trabalhos paralelos com cenas de gênero nunca eram deixados de lado. Trabalhava intensamente, como tudo sempre foi muito intenso em sua vida. O respeito e a admiração pela sua produção já não era restrito a pequenos grupos. Seus trabalhos eram disputados por colecionadores e esperados em muitas mostras e exposições. GEROLAMO INDUNO - Menina depois de um ataque de bombas - Óleo sobre tela GEROLAMO INDUNO - Sentinela Óleo sobre cartão - 40 x 28 Continuou por toda a sua vida a produzir aquilo que lhe inspirava e lhe fazia feliz. Manteve sempre a técnica brilhante, com uma facilidade pictórica que impressionava a todos. Até o fim de seus dias, esmerava em suas obras com a mesma disposição de um iniciante, e se prestava aos detalhes de suas composições com o mesmo entusiasmo de quando aprendia com seu mestre. Continuou sempre fiel aos seus princípios e àquilo que o mantinha no mundo da arte. Muito mais que um artista competente, era um cidadão que abraçava as causas nacionalistas e as defendia como quem defende a vida. Depois de uma longa doença, Gerolamo faleceu a 19 de dezembro de 1890, na mesma cidade que nascera. GEROLAMO INDUNO - Soldados na Stevio Pass - Óleo sobre tela - 44,5 x 59,5 GEROLAMO INDUNO - Infantaria na Crimeia - Óleo sobre tela - 37,7 x 48 Hoje, Gerolamo Induno é preciso ser lembrado e respeitado como um artista de referência. Viveu numa época onde a fotografia ainda engatinhava e o artista se ocupava em registrar as coisas de seu mundo. Ele fez isso como poucos. Muito do que se sabe e viu dos movimentos libertários da Itália do século XIX, deve ao trabalho incansável de artistas como ele.
DANIEL GERHARTZ - No paraíso das águas - Óleo sobre tela - 101,6 x 152,4 DANIEL GERHARTZ - Minha sobrinha ao cavalete - Óleo sobre tela - 101,6 x 76,2 Entre tantos artistas americanos da atualidade, um deles se destaca especialmente pela sua proposta, pela sua técnica e acima de tudo pela dedicação com que abraça sua profissão e a deixa transparecer em cada obra que assina. Dono de uma técnica hábil e de um trabalho refinado, Daniel Gerhartz é daqueles artistas que nos aprisiona com suas obras, logo na primeira olhada. Diz muito em poucas pinceladas e nos convida a mergulhar num mundo de poesia e beleza. DANIEL GERHARTZ - Direto da horta Óleo sobre tela - 101,6 x 76,2 DANIEL GERHARTZ - Nos seus sonhos Óleo sobre tela Nascido em Wisconsin, no ano de 1965, despertou o interesse pelo desenho logo cedo. O primeiro passo para sua aprendizagem técnica se deu na Academia Americana de Arte de Chicago, onde fez questão de afirmar seus estudos dentro da tradição clássica de pintura e desenho, polindo seu aprendizado com as mais diferentes técnicas. DANIEL GERHARTZ - Com o avô Óleo sobre tela DANIEL GERHARTZ - Maravilha Óleo sobre tela - 101,6 x 152,4 Depois de passar um período com arte publicitária, começou a perseguir seu sonho com mais afinco, visitando vários museus, com o intuito de estudar os trabalhos dos vários mestres que sempre tanto admirou. E procurou fazer isso ao lado de amigos artistas contemporâneos, com os quais sempre dividiu e compartilhou aprendizados e ensinamentos. DANIEL GERHARTZ - Com o jarro - Óleo sobre tela - Detalhe DANIEL GERHARTZ - Tresses Óleo sobre tela - Início de trabalho Daniel Gerhartz, após longos anos de estudos, acabou aderindo a uma técnica de abordagem direta, com um trabalho quase em alla prima, mas captando tantas nuances com tanta sutileza e precisão, que seus trabalhos remetem a técnicas esmeradas em muitas seções e etapas. A anatomia é estudada com uma rigorosa precisão, não no sentido apenas físico. Ele capta sentimentos em seus personagens, com um domínio absoluto de suas expressões e emoções. DANIEL GERHARTZ - Todas as novidades - Óleo sobre tela - 101,6 x 152,4 DANIEL GERHARTZ - Um dia com a mãe Óleo sobre tela - 101,6 x 76,2 É um artista que louva a natureza criada, na forma como o homem se relaciona com o ambiente que o cerca, e com a conexão que existe nesse relacionamento. Suas obras nos transmitem magia, pois são atemporais e nos transportam para mundos idealizados. Cenas onde gostaríamos de estar e de lá não sair. Produtos de sua introspecção de artista, resultados da tranqüilidade e repouso com as quais são criadas. DANIEL GERHARTZ - Uma brisa morna - Óleo sobre tela - 101,6 x 152,4 Palavras do próprio artista: “Meu objetivo é captar a riqueza de nossa experiência humana, os contrastes entre a vida e morte, o belo e o comum, a tristeza e a alegria, a esperança e o desespero. Quero oferecer, no final, uma mensagem que aponte esperança e nos faça sentir eternos”. PARA SABER MAIS: www.danielgerhartz.com
WILLIAM BOUGUEREAU - Admiração - Óleo sobre tela - 147 x 200 - 1897 WILLIAM BOUGUEREAU - Mulher de Cervara e sua criança Óleo sobre tela - 109,2 x 83,2 - 1861 Ao longo da História da Arte, é de praxe que estilos e movimentos se alternem como gostos populares. É normal que artistas se tornem as “estrelas da vez” e conquistem fama e prestígio imensuráveis. Evidentemente, isso nem sempre acontece da maneira mais amigável possível, porque na Arte, como em nenhum outro lugar, os egos se inflamam de uma maneira desproporcional. Quem está no domínio do cenário não quer perder as rédeas e quem está para assumir o espaço, faz o impossível para conquista-lo. Os anos finais do século XIX testemunharam uma das batalhas mais ferrenhas que já aconteceram no campo das artes. A França foi o palco de toda essa controvérsia, uma vez que estava à frente dos acontecimentos culturais da Europa. O Academicismo, que dominava a cena no momento, se viu açoitado, humilhado e vencido pelas correntes modernistas, que jogaram com todas as cartas que podiam e não pouparam ninguém. William Bouguereau, o grande defensor do ensino acadêmico e o nome de destaque daquela época, serviu como uma espécie de bode expiatório para essa batalha. Batalha que lhe custou a glória e os méritos, conquistados por toda uma vida dedicada ao que mais gostava de fazer. WILLIAM BOUGUEREAU - A primeira discórdia, Caim e Abel Óleo sobre tela - 196,2 x 150,5 - 1861 WILLIAM BOUGUEREAU - Biblis - Óleo sobre tela - 50 x 80,5 - 1884 Mas, o que realmente aconteceu para que as coisas chegassem a tal ponto? Como pode, alguém que era considerado o mais competente artista vivo de seu tempo, se transformar no mais desprezível artista do momento, a ponto de ter seu nome apagado de todas as futuras enciclopédias e livros? O que leva um artista do nível de Bouguereau, ter seus quadros escondidos nos depósitos de museus durante décadas? Por que, de uma hora para outra, aquele que era a referência maior do ideal artístico, se tornara a referência do que deveria ser evitado? Para responder a essas perguntas e ser imparcial com os resultados das respostas que sucederam àquele triste período, é preciso conhecer um pouco mais como tudo se passava naquela época, principalmente com Bouguereau, o mais prejudicado com tudo aquilo acontecido naquele período. WILLIAM BOUGUEREAU A flagelação de Nosso Senhor Jesus Cristo Óleo sobre tela - 309 x 210 - 1880 WILLIAM BOUGUEREAU - Pietá Óleo sobre tela -222,9 x 149,2 - 1876 William Bouguereau se adequou com todas as forças possíveis para aquilo que sonhou um dia para sua arte, tornar-se um verdadeiro artista acadêmico. Mas, o que vem a ser Academicismo e o que isso trouxe para o cenário artístico mundial? Academismo é um método de ensino nascido no século XVI, fruto maior das ideias renascentistas. Em meados do século XIX, essa corrente de pensamento chegou a obter uma influência dominante. As academias davam grande valor ao que foi experimentado e consolidado pelos antigos mestres, realçando ainda mais os ensinamentos deles baseados na tradição clássica. Além de ter um caráter estético, havia também uma ética, através da qual era traçada toda a proposta pedagógica de quem se propunha a tornar um acadêmico. Um dos objetivos maiores idealizados na tradição acadêmica, é que a arte educasse o público; não só apenas os artistas que a praticavam; mas também a todos aqueles que a admirassem de alguma forma. E que essa educação proposta, transformasse toda a sociedade para melhor. Como sempre dependeu dos poderes de cada governante, os artistas acadêmicos acabavam sendo envolvidos por compromissos políticos e sociais. Graças a essa organização que funcionava muito bem, muito do que existe hoje como referência de museus e galerias de arte, nasceram da vontade acadêmica de preservar a cultura e deixa-la para todas as gerações futuras. WILLIAM BOUGUEREAU - O nascimento de Vênus Óleo sobre tela - 300 x 217 - 1879 WILLIAM BOUGUEREAU - Um vento natural - Óleo sobre tela - 1881 Para ser um artista acadêmico, no rigor da palavra, o caminho era bastante árduo. Havia todo um aprendizado sistemático e graduado, ministrado por um mestre competente, que repassava os ensinamentos de mestres do passado. Além de todo o aparato teórico, obtido em anos de profundo estudo, que abrangiam as mais variadas áreas de ensino (História, Filosofia, Mitologia, Poesia, Religião...), o artista precisava ser, acima de tudo, muito eficiente em sua profissão. A habilidade para a execução de um desenho rigoroso era indispensável, pois nele estava toda a base da obra acadêmica. Era pelo desenho preciso que se estruturava toda a composição no início da obra, como também permitia alterações seguras no decorrer dela. Tudo começava com inúmeros esboços preparatórios, onde todos os elementos da obra eram posicionados minuciosamente. O conhecimento de anatomia era exigido com rigores extremos, uma vez que toda composição acadêmica estava situada em torno da figura humana. WILLIAM BOUGUEREAU - Uma bacante e uma cabra - Óleo sobre tela - 160,5 x 228 - 1862 WILLIAM BOUGUEREAU - O retorno da colheita - Óleo sobre tela - 241,3 x 170,1 - 1878 Bouguereau não só se muniu de todos os atributos citados anteriormente, como conseguiu supera-los em todos os quesitos. Impressionava, acima de tudo, a suavidade e a textura que conseguia na reprodução da pele humana e como representava impecavelmente as formas e gestos obtidos nas mãos, pés e faces de seus personagens. O perfeccionismo não era uma exigência trilhada por Bouguereau, mas, uma normalidade. Cada centímetro de sua tela era minuciosamente trabalhado, mantendo um acabamento de altíssima qualidade. As marcas de pincéis eram praticamente invisíveis, fundidas em laboriosos esfumatos. Ele parecia sempre insatisfeito com os resultados, retocando as composições, mesmo depois de dá-las por terminadas. A consequência disso tudo era a excelência dominada com anos e anos de execução. Bouguereau era a referência maior em todos os lugares que passava e conquistava todos os prêmios que almejava e concorria. O domínio profundo das normas acadêmicas lhe trouxe cargos importantes, tanto nas escolas, como junto ao poder que as financiava. Começava assim, um perigoso caminho na vida do artista. WILLIAM BOUGUEREAU Zenóbia encontrada pelos pastores nas margens do Araxes Óleo sobre tela - 148 x 118 - 1850 WILLIAM BOUGUEREAU - Dante e Virgílio no inferno Óleo sobre tela - 280,5 x 225,3 - 1850 Paris era, inevitavelmente, a meca cultural do mundo naquele momento, e o Salão, a grande vitrine que testemunhava esse domínio cultural. O Salão era um evento competitivo, que tinha um caráter artístico, mas também comercial. Era ali que os artistas consagrados se exibiam e também era ali que os iniciantes tinham a oportunidade de se projetar para o mundo das artes. O acesso ao Salão não era nada fácil, pois os acadêmicos eram os organizadores do evento, e utilizavam dele como uma ferramenta poderosa no controle do que deveria ou não ser produzido pelos artistas naquele momento. Já que a meta do Academicismo sempre foi implantar um sistema que prezasse pelo culto às referências clássicas, serviam para ingressar ao salão somente as obras que se encaixassem nas temáticas históricas, religiosas ou mitológicas. Essa espécie de controle da liberdade de expressão, com o passar dos anos, já era visto com desconfiança por muitos artistas. O próprio público já começava a ficar entediado em ver corredores e mais corredores de obras com as mesmas temáticas. Mas, nem mesmo assim os organizadores do Salão cediam. Bouguereau, como um dos líderes do movimento acadêmico naquele momento, e presidente da Sociedade dos Artistas Franceses, a mesma que organizava e ditava as normas do salão, começou a instituir severas restrições a obras que não se encaixassem nos propósitos da instituição e do evento, irritando ainda mais as novas propostas artísticas que desejavam um espaço para expor. A lista de trabalhos recusados na seleção para o salão enchia galpões e aumentava ainda mais a ira dos adversários àquele sistema. WILLIAM BOUGUEREAU - Oréadas - Óleo sobre tela - 236 x 182 - 1902 WILLIAM BOUGUEREAU - A primeira manhã - Óleo sobre tela - 203 x 252 - 1888 Os tempos acenavam mudanças significativas em todas as direções. A classe média, que começava a frequentar os salões e se tornar um importante comprador de obras, e que nem sempre tinha a mesma bagagem cultural da elite dominante, para absorver a arte clássica de até então, começava a abrir os olhos para outros tipos de manifestações. Queriam ver ali, também expostas, obras do cotidiano de todos, cenas pitorescas e realistas, bem como temas exóticos, como os da Idade Média ou do Oriente. Muitos artistas, há tempos já produziam dentro dessas novas propostas, mas, esses nunca conseguiam oportunidade para expor no grande salão. O próprio Bouguereau, à partir da década de 1860, começou a livrar da produção histórica e religiosa, com temática rigorosamente acadêmica, que sempre foi a marca de sua reputação. Como o gosto dos clientes mudava, ele adaptava facilmente a eles. Produzindo séries intermináveis de nus, cada vez mais sensuais e provocantes, bem como anjos e cupidos entregues à mais deleitosa perdição. Nesse momento, seus opositores o atacavam ainda mais ferozmente, afirmando que ele prostituía sua arte e seus propósitos, em nome de dinheiro e status. Ele defendia, afirmando que apesar de mesmo produzindo algo popular, ainda o fazia com classe e rigores técnicos, e não tinha culpa, se os outros não conseguiam fazer o mesmo. Esquerda: WILLIAM BOUGUEREAU - Momentos do dia, Aurora - Óleo sobre tela - 124,4 x 63,7 - 1881 Centro: WILLIAM BOUGUEREAU - Momentos do dia, Crepúsculo - Óleo sobre tela - 1882 Direita: WILLIAM BOUGUEREAU - Momentos do dia, Noite - Óleo sobre tela - 208,2 x 107,3 - 1883 Se havia motivos que irritassem os adversários de Bouguereau, ele parecia já ter provocado todos. Suas obras atingiam valores astronômicos. Corria até uma piada dizendo que ele perdia cinco francos, toda vez que largava seus pincéis para urinar. Esse tipo de extravagância só nutria a inveja e a ira dos que iam em desencontro aos seus propósitos. Muitos artistas, que praticamente viviam em petição de miséria, não se conformavam em ver as oportunidades restritas nas mãos de uma minoria elitizada de artistas. Os modernistas, principalmente os impressionistas, que há anos buscavam algum espaço, já caíam no gosto da nova classe consumista, pois começavam a expor e conquistar um público considerável nos salões alternativos, já que eram sistematicamente recusados nos salões principais. Foram justamente eles, os mais implacáveis contra Bouguereau e seus seguidores. Degas, um dos ícones do movimento impressionista, chegou a criar o termo “bougueresco”, como um sinônimo pejorativo a tudo aquilo que lembrava o que era produzido por Bouguereau e sua turma. O Academicismo já era visto por muitos como artificialidade, um sistema que se embotava por falta de originalidade e que minava a criatividade dos que queriam produzir algo inusitado. WILLIAM BOUGUEREAU - Na fonte Óleo sobre tela - 142 x 86,5 - 1897 WILLIAM BOUGUEREAU - Uma infância idílica - Óleo sobre tela - 102 x 130 - 1900 Os modernistas atraíam vários artistas para sua briga, principalmente porque defendiam um movimento sem amarras, onde a liberdade de expressão era ilimitada. Com os modernistas dominando todos os olhares e atraindo a atenção de marchands, colecionadores e novos espaços de exposição, o período acadêmico chegou ao fim. Pelo menos, a tirania imposta pelos líderes do movimento foi cedendo paulatinamente ao gosto da população e principalmente dos artistas. As obras acadêmicas já não vendiam mais e literalmente desapareceram do mercado. Os seus artistas foram caindo no esquecimento e se tornou difícil ouvir qualquer referência sobre eles até mesmo nas escolas de arte, a não ser como um exemplo do que não fazer. Ficou evidente que a oposição contra os artistas acadêmicos, principalmente Bouguereau, se deu pelo fato de, principalmente ele, ser tecnicamente bom demais no que fazia, ter produzido fortuna quando muitos mal sobreviviam do que produziam e principalmente não ter sido mais tolerante com as vanguardas que conviviam e produziam naquele período, uma vez que estava na liderança das instituições e tinha forte opinião junto aos governos. Todo sistema que se torna arrogante, terá adversários ao longo do caminho. WILLIAM BOUGUEREAU - A família sagrada Óleo sobre tela - 137 x 108 - 1863 WILLIAM BOUGUEREAU - Amor fraternal Óleo sobre tela - 147 x 103,7 - 1851 Até o início do século XX, as obras de Bouguereau eram disputadas avidamente e compradas por milionários de várias regiões da Europa e Estados Unidos. Para muitos, ele era considerado o mais importante artista francês de todos os tempos. Porém, depois de 1920, devido a forte influência de críticos de arte sobre o que gostar e colecionar, e principalmente por Bouguereau ter se posicionado tão fortemente contra os impressionistas, ele foi caindo no descrédito. Durante décadas, seu nome foi esquecido e sequer mencionado nas muitas enciclopédias que foram surgindo ao longo do século XX. Muitos museus, praticamente esconderam seus quadros. Por cerca de sete décadas, Bouguereau se tornou praticamente inexistente, até que, em 1974, uma primeira exposição com obras suas, montada no Museu de Luxemburgo, causou alguma sensação. Em outras mostras montadas nos anos seguintes, alguns críticos contemporâneos ainda insistiam na tecla de que sua obra era vazia e árida, mesmo reconhecendo nele a genialidade técnica quase incomparável. WILLIAM BOUGUEREAU - Alma Parens - Óleo sobre tela - 230,5 x 139,7 - 1883 Curiosamente, a tirania imposta pelos acadêmicos aos modernistas, quando estavam no poder, é a mesma imposta pelos contemporâneos que dominam o atual cenário. Vê-se claramente que o que está em jogo não é a eficiência ou a produção dos artistas que ainda executam trabalhos acadêmicos ou similares, nem dos muitos mestres passados que tanto contribuíram para que a arte chegasse até aqui, mas, a ameaça do controle de galerias e instituições que lucram fortunas com a venda dos artistas que estão no topo do mercado. Por isso, críticos de arte se tornaram vendedores de novidades e influenciam fortemente a opinião daqueles que não tem discernimento suficiente para escolher um trabalho para adquirir. Tanto naquela época, quanto nessa, a ganância cega os olhos para a verdadeira arte e impõe aquilo sobre o que as pessoas sequer entendem. Se naquela época, as obras acadêmicas foram criticadas por não serem acessíveis à maioria, o pior acontece nos tempos atuais. Exposições são montadas com obras que precisam de quase um formulário para poder explica-las. Não são acessíveis nem mesmo para quem está no mercado de arte. WILLIAM BOUGUEREAU - A batalha dos Centauros e Lapiths Óleo sobre tela - 124,5 x 174,3 - 1853 WILLIAM BOUGUEREAU - Pequenas pedintes - Óleo sobre tela - 161 x 93,5 - 1890 Lamentável é ver como um artista, com as qualidades técnicas que possuía um Bouguereau, seja relegado ao isolamento, por um puro capricho daqueles que o temiam fortemente naquele período. Em 2000, o Art Renewal Center, fundado por Fred Ross, artistas e colecionadores favoráveis às belas-artes, vem defendendo os valores anteriormente conquistados pelos trabalhos acadêmicos. A crescente demanda por obras e a grande procura por artista produtores de belas-artes é uma realidade em todo o mundo. A internet tem colaborado bastante para isso, pois, sendo uma galeria aberta e imparcial, as pessoas fazem livremente as suas escolhas. Resta esperar por um dia, onde o respeito às manifestações artísticas, de qualquer espécie, seja o ponto alto da natureza humana. Sendo a única espécie nesse planeta a produzir arte, pelo menos intencionalmente, o homem é bem melhor do que essa mesquinha luta de mercados que existe por aí. Para aqueles que produzem arte, e a fazem com a melhor das boas intenções e prazer, uma frase deixada por Bouguereau continua mais atual do que nunca: “A cada dia entro em meu estúdio cheio de alegria; à noite, quando a escuridão me obriga a deixá-lo, mal posso esperar pelo dia seguinte. Se eu não pudesse devotar-me à minha amada pintura eu seria um pobre coitado.” WILLIAM BOUGUEREAU - Autorretrato Óleo sobre tela - Coleção particular 46 x 38,4 - 1886
WILLIAM BOUGUEREAU - Admiração - Óleo sobre tela - 147 x 200 - 1897 WILLIAM BOUGUEREAU - Mulher de Cervara e sua criança Óleo sobre tela - 109,2 x 83,2 - 1861 Ao longo da História da Arte, é de praxe que estilos e movimentos se alternem como gostos populares. É normal que artistas se tornem as “estrelas da vez” e conquistem fama e prestígio imensuráveis. Evidentemente, isso nem sempre acontece da maneira mais amigável possível, porque na Arte, como em nenhum outro lugar, os egos se inflamam de uma maneira desproporcional. Quem está no domínio do cenário não quer perder as rédeas e quem está para assumir o espaço, faz o impossível para conquista-lo. Os anos finais do século XIX testemunharam uma das batalhas mais ferrenhas que já aconteceram no campo das artes. A França foi o palco de toda essa controvérsia, uma vez que estava à frente dos acontecimentos culturais da Europa. O Academicismo, que dominava a cena no momento, se viu açoitado, humilhado e vencido pelas correntes modernistas, que jogaram com todas as cartas que podiam e não pouparam ninguém. William Bouguereau, o grande defensor do ensino acadêmico e o nome de destaque daquela época, serviu como uma espécie de bode expiatório para essa batalha. Batalha que lhe custou a glória e os méritos, conquistados por toda uma vida dedicada ao que mais gostava de fazer. WILLIAM BOUGUEREAU - A primeira discórdia, Caim e Abel Óleo sobre tela - 196,2 x 150,5 - 1861 WILLIAM BOUGUEREAU - Biblis - Óleo sobre tela - 50 x 80,5 - 1884 Mas, o que realmente aconteceu para que as coisas chegassem a tal ponto? Como pode, alguém que era considerado o mais competente artista vivo de seu tempo, se transformar no mais desprezível artista do momento, a ponto de ter seu nome apagado de todas as futuras enciclopédias e livros? O que leva um artista do nível de Bouguereau, ter seus quadros escondidos nos depósitos de museus durante décadas? Por que, de uma hora para outra, aquele que era a referência maior do ideal artístico, se tornara a referência do que deveria ser evitado? Para responder a essas perguntas e ser imparcial com os resultados das respostas que sucederam àquele triste período, é preciso conhecer um pouco mais como tudo se passava naquela época, principalmente com Bouguereau, o mais prejudicado com tudo aquilo acontecido naquele período. WILLIAM BOUGUEREAU A flagelação de Nosso Senhor Jesus Cristo Óleo sobre tela - 309 x 210 - 1880 WILLIAM BOUGUEREAU - Pietá Óleo sobre tela -222,9 x 149,2 - 1876 William Bouguereau se adequou com todas as forças possíveis para aquilo que sonhou um dia para sua arte, tornar-se um verdadeiro artista acadêmico. Mas, o que vem a ser Academicismo e o que isso trouxe para o cenário artístico mundial? Academismo é um método de ensino nascido no século XVI, fruto maior das ideias renascentistas. Em meados do século XIX, essa corrente de pensamento chegou a obter uma influência dominante. As academias davam grande valor ao que foi experimentado e consolidado pelos antigos mestres, realçando ainda mais os ensinamentos deles baseados na tradição clássica. Além de ter um caráter estético, havia também uma ética, através da qual era traçada toda a proposta pedagógica de quem se propunha a tornar um acadêmico. Um dos objetivos maiores idealizados na tradição acadêmica, é que a arte educasse o público; não só apenas os artistas que a praticavam; mas também a todos aqueles que a admirassem de alguma forma. E que essa educação proposta, transformasse toda a sociedade para melhor. Como sempre dependeu dos poderes de cada governante, os artistas acadêmicos acabavam sendo envolvidos por compromissos políticos e sociais. Graças a essa organização que funcionava muito bem, muito do que existe hoje como referência de museus e galerias de arte, nasceram da vontade acadêmica de preservar a cultura e deixa-la para todas as gerações futuras. WILLIAM BOUGUEREAU - O nascimento de Vênus Óleo sobre tela - 300 x 217 - 1879 WILLIAM BOUGUEREAU - Um vento natural - Óleo sobre tela - 1881 Para ser um artista acadêmico, no rigor da palavra, o caminho era bastante árduo. Havia todo um aprendizado sistemático e graduado, ministrado por um mestre competente, que repassava os ensinamentos de mestres do passado. Além de todo o aparato teórico, obtido em anos de profundo estudo, que abrangiam as mais variadas áreas de ensino (História, Filosofia, Mitologia, Poesia, Religião...), o artista precisava ser, acima de tudo, muito eficiente em sua profissão. A habilidade para a execução de um desenho rigoroso era indispensável, pois nele estava toda a base da obra acadêmica. Era pelo desenho preciso que se estruturava toda a composição no início da obra, como também permitia alterações seguras no decorrer dela. Tudo começava com inúmeros esboços preparatórios, onde todos os elementos da obra eram posicionados minuciosamente. O conhecimento de anatomia era exigido com rigores extremos, uma vez que toda composição acadêmica estava situada em torno da figura humana. WILLIAM BOUGUEREAU - Uma bacante e uma cabra - Óleo sobre tela - 160,5 x 228 - 1862 WILLIAM BOUGUEREAU - O retorno da colheita - Óleo sobre tela - 241,3 x 170,1 - 1878 Bouguereau não só se muniu de todos os atributos citados anteriormente, como conseguiu supera-los em todos os quesitos. Impressionava, acima de tudo, a suavidade e a textura que conseguia na reprodução da pele humana e como representava impecavelmente as formas e gestos obtidos nas mãos, pés e faces de seus personagens. O perfeccionismo não era uma exigência trilhada por Bouguereau, mas, uma normalidade. Cada centímetro de sua tela era minuciosamente trabalhado, mantendo um acabamento de altíssima qualidade. As marcas de pincéis eram praticamente invisíveis, fundidas em laboriosos esfumatos. Ele parecia sempre insatisfeito com os resultados, retocando as composições, mesmo depois de dá-las por terminadas. A consequência disso tudo era a excelência dominada com anos e anos de execução. Bouguereau era a referência maior em todos os lugares que passava e conquistava todos os prêmios que almejava e concorria. O domínio profundo das normas acadêmicas lhe trouxe cargos importantes, tanto nas escolas, como junto ao poder que as financiava. Começava assim, um perigoso caminho na vida do artista. WILLIAM BOUGUEREAU Zenóbia encontrada pelos pastores nas margens do Araxes Óleo sobre tela - 148 x 118 - 1850 WILLIAM BOUGUEREAU - Dante e Virgílio no inferno Óleo sobre tela - 280,5 x 225,3 - 1850 Paris era, inevitavelmente, a meca cultural do mundo naquele momento, e o Salão, a grande vitrine que testemunhava esse domínio cultural. O Salão era um evento competitivo, que tinha um caráter artístico, mas também comercial. Era ali que os artistas consagrados se exibiam e também era ali que os iniciantes tinham a oportunidade de se projetar para o mundo das artes. O acesso ao Salão não era nada fácil, pois os acadêmicos eram os organizadores do evento, e utilizavam dele como uma ferramenta poderosa no controle do que deveria ou não ser produzido pelos artistas naquele momento. Já que a meta do Academicismo sempre foi implantar um sistema que prezasse pelo culto às referências clássicas, serviam para ingressar ao salão somente as obras que se encaixassem nas temáticas históricas, religiosas ou mitológicas. Essa espécie de controle da liberdade de expressão, com o passar dos anos, já era visto com desconfiança por muitos artistas. O próprio público já começava a ficar entediado em ver corredores e mais corredores de obras com as mesmas temáticas. Mas, nem mesmo assim os organizadores do Salão cediam. Bouguereau, como um dos líderes do movimento acadêmico naquele momento, e presidente da Sociedade dos Artistas Franceses, a mesma que organizava e ditava as normas do salão, começou a instituir severas restrições a obras que não se encaixassem nos propósitos da instituição e do evento, irritando ainda mais as novas propostas artísticas que desejavam um espaço para expor. A lista de trabalhos recusados na seleção para o salão enchia galpões e aumentava ainda mais a ira dos adversários àquele sistema. WILLIAM BOUGUEREAU - Oréadas - Óleo sobre tela - 236 x 182 - 1902 WILLIAM BOUGUEREAU - A primeira manhã - Óleo sobre tela - 203 x 252 - 1888 Os tempos acenavam mudanças significativas em todas as direções. A classe média, que começava a frequentar os salões e se tornar um importante comprador de obras, e que nem sempre tinha a mesma bagagem cultural da elite dominante, para absorver a arte clássica de até então, começava a abrir os olhos para outros tipos de manifestações. Queriam ver ali, também expostas, obras do cotidiano de todos, cenas pitorescas e realistas, bem como temas exóticos, como os da Idade Média ou do Oriente. Muitos artistas, há tempos já produziam dentro dessas novas propostas, mas, esses nunca conseguiam oportunidade para expor no grande salão. O próprio Bouguereau, à partir da década de 1860, começou a livrar da produção histórica e religiosa, com temática rigorosamente acadêmica, que sempre foi a marca de sua reputação. Como o gosto dos clientes mudava, ele adaptava facilmente a eles. Produzindo séries intermináveis de nus, cada vez mais sensuais e provocantes, bem como anjos e cupidos entregues à mais deleitosa perdição. Nesse momento, seus opositores o atacavam ainda mais ferozmente, afirmando que ele prostituía sua arte e seus propósitos, em nome de dinheiro e status. Ele defendia, afirmando que apesar de mesmo produzindo algo popular, ainda o fazia com classe e rigores técnicos, e não tinha culpa, se os outros não conseguiam fazer o mesmo. Esquerda: WILLIAM BOUGUEREAU - Momentos do dia, Aurora - Óleo sobre tela - 124,4 x 63,7 - 1881 Centro: WILLIAM BOUGUEREAU - Momentos do dia, Crepúsculo - Óleo sobre tela - 1882 Direita: WILLIAM BOUGUEREAU - Momentos do dia, Noite - Óleo sobre tela - 208,2 x 107,3 - 1883 Se havia motivos que irritassem os adversários de Bouguereau, ele parecia já ter provocado todos. Suas obras atingiam valores astronômicos. Corria até uma piada dizendo que ele perdia cinco francos, toda vez que largava seus pincéis para urinar. Esse tipo de extravagância só nutria a inveja e a ira dos que iam em desencontro aos seus propósitos. Muitos artistas, que praticamente viviam em petição de miséria, não se conformavam em ver as oportunidades restritas nas mãos de uma minoria elitizada de artistas. Os modernistas, principalmente os impressionistas, que há anos buscavam algum espaço, já caíam no gosto da nova classe consumista, pois começavam a expor e conquistar um público considerável nos salões alternativos, já que eram sistematicamente recusados nos salões principais. Foram justamente eles, os mais implacáveis contra Bouguereau e seus seguidores. Degas, um dos ícones do movimento impressionista, chegou a criar o termo “bougueresco”, como um sinônimo pejorativo a tudo aquilo que lembrava o que era produzido por Bouguereau e sua turma. O Academicismo já era visto por muitos como artificialidade, um sistema que se embotava por falta de originalidade e que minava a criatividade dos que queriam produzir algo inusitado. WILLIAM BOUGUEREAU - Na fonte Óleo sobre tela - 142 x 86,5 - 1897 WILLIAM BOUGUEREAU - Uma infância idílica - Óleo sobre tela - 102 x 130 - 1900 Os modernistas atraíam vários artistas para sua briga, principalmente porque defendiam um movimento sem amarras, onde a liberdade de expressão era ilimitada. Com os modernistas dominando todos os olhares e atraindo a atenção de marchands, colecionadores e novos espaços de exposição, o período acadêmico chegou ao fim. Pelo menos, a tirania imposta pelos líderes do movimento foi cedendo paulatinamente ao gosto da população e principalmente dos artistas. As obras acadêmicas já não vendiam mais e literalmente desapareceram do mercado. Os seus artistas foram caindo no esquecimento e se tornou difícil ouvir qualquer referência sobre eles até mesmo nas escolas de arte, a não ser como um exemplo do que não fazer. Ficou evidente que a oposição contra os artistas acadêmicos, principalmente Bouguereau, se deu pelo fato de, principalmente ele, ser tecnicamente bom demais no que fazia, ter produzido fortuna quando muitos mal sobreviviam do que produziam e principalmente não ter sido mais tolerante com as vanguardas que conviviam e produziam naquele período, uma vez que estava na liderança das instituições e tinha forte opinião junto aos governos. Todo sistema que se torna arrogante, terá adversários ao longo do caminho. WILLIAM BOUGUEREAU - A família sagrada Óleo sobre tela - 137 x 108 - 1863 WILLIAM BOUGUEREAU - Amor fraternal Óleo sobre tela - 147 x 103,7 - 1851 Até o início do século XX, as obras de Bouguereau eram disputadas avidamente e compradas por milionários de várias regiões da Europa e Estados Unidos. Para muitos, ele era considerado o mais importante artista francês de todos os tempos. Porém, depois de 1920, devido a forte influência de críticos de arte sobre o que gostar e colecionar, e principalmente por Bouguereau ter se posicionado tão fortemente contra os impressionistas, ele foi caindo no descrédito. Durante décadas, seu nome foi esquecido e sequer mencionado nas muitas enciclopédias que foram surgindo ao longo do século XX. Muitos museus, praticamente esconderam seus quadros. Por cerca de sete décadas, Bouguereau se tornou praticamente inexistente, até que, em 1974, uma primeira exposição com obras suas, montada no Museu de Luxemburgo, causou alguma sensação. Em outras mostras montadas nos anos seguintes, alguns críticos contemporâneos ainda insistiam na tecla de que sua obra era vazia e árida, mesmo reconhecendo nele a genialidade técnica quase incomparável. WILLIAM BOUGUEREAU - Alma Parens - Óleo sobre tela - 230,5 x 139,7 - 1883 Curiosamente, a tirania imposta pelos acadêmicos aos modernistas, quando estavam no poder, é a mesma imposta pelos contemporâneos que dominam o atual cenário. Vê-se claramente que o que está em jogo não é a eficiência ou a produção dos artistas que ainda executam trabalhos acadêmicos ou similares, nem dos muitos mestres passados que tanto contribuíram para que a arte chegasse até aqui, mas, a ameaça do controle de galerias e instituições que lucram fortunas com a venda dos artistas que estão no topo do mercado. Por isso, críticos de arte se tornaram vendedores de novidades e influenciam fortemente a opinião daqueles que não tem discernimento suficiente para escolher um trabalho para adquirir. Tanto naquela época, quanto nessa, a ganância cega os olhos para a verdadeira arte e impõe aquilo sobre o que as pessoas sequer entendem. Se naquela época, as obras acadêmicas foram criticadas por não serem acessíveis à maioria, o pior acontece nos tempos atuais. Exposições são montadas com obras que precisam de quase um formulário para poder explica-las. Não são acessíveis nem mesmo para quem está no mercado de arte. WILLIAM BOUGUEREAU - A batalha dos Centauros e Lapiths Óleo sobre tela - 124,5 x 174,3 - 1853 WILLIAM BOUGUEREAU - Pequenas pedintes - Óleo sobre tela - 161 x 93,5 - 1890 Lamentável é ver como um artista, com as qualidades técnicas que possuía um Bouguereau, seja relegado ao isolamento, por um puro capricho daqueles que o temiam fortemente naquele período. Em 2000, o Art Renewal Center, fundado por Fred Ross, artistas e colecionadores favoráveis às belas-artes, vem defendendo os valores anteriormente conquistados pelos trabalhos acadêmicos. A crescente demanda por obras e a grande procura por artista produtores de belas-artes é uma realidade em todo o mundo. A internet tem colaborado bastante para isso, pois, sendo uma galeria aberta e imparcial, as pessoas fazem livremente as suas escolhas. Resta esperar por um dia, onde o respeito às manifestações artísticas, de qualquer espécie, seja o ponto alto da natureza humana. Sendo a única espécie nesse planeta a produzir arte, pelo menos intencionalmente, o homem é bem melhor do que essa mesquinha luta de mercados que existe por aí. Para aqueles que produzem arte, e a fazem com a melhor das boas intenções e prazer, uma frase deixada por Bouguereau continua mais atual do que nunca: “A cada dia entro em meu estúdio cheio de alegria; à noite, quando a escuridão me obriga a deixá-lo, mal posso esperar pelo dia seguinte. Se eu não pudesse devotar-me à minha amada pintura eu seria um pobre coitado.” WILLIAM BOUGUEREAU - Autorretrato Óleo sobre tela - Coleção particular 46 x 38,4 - 1886
HUIHAN LIU - Belezas tibetanas - Óleo sobre tela - 76,2 x 61 É emocionante ver a trajetória de vida de certos artistas e o grau de maturidade artística e respeito que conquistaram. A trajetória de Huihan Liu é de orgulhar qualquer carreira. Nascido em Guangzhou, na China, em 1952, é mais um dos bem-sucedidos artistas chineses que vieram complementar suas carreiras no oeste americano. HUIHAN LIU - Primavera na Vila Miao Óleo sobre tela - 76,2 x 101,6 HUIHAN LIU - Partida - Óleo sobre tela - 45,7 x 61 Huihan Liu cresceu ali mesmo, em Guangzhou, capital da província de Cantão, e teve a infelicidade de estar naquele lugar num de seus momentos mais difíceis, durante os primeiros anos da República Popular. A fome sempre foi um estado permanente naqueles tempos, afirmou o artista certa vez. Se para se manter vivo já era difícil, imagine para um artista que resolvera abraçar a profissão. Seus primeiros anos de aprendizagem se limitaram basicamente a exercícios com lápis e papel. Era apenas com esses materiais, os únicos que conseguia comprar, que ia a campo fazer esboços de árvores e casas. Quando possível, ia também ao zoológico local para exercitar desenhos de animais. Dedicado, tirou o melhor proveito possível do estilo realista, vindo da influência de escolas soviéticas. Praticou incansavelmente os exercícios de sua escola e isso fez com que assimilasse muito bem todos os princípios básicos de um bom artista. HUIHAN LIU - Hora do chá - Óleo sobre tela - 50,8 x 40,6 As coisas pioraram ainda mais em 1966, quando o Presidente Mao Tse Tung lançou a Revolução Cultural. Aquela revolução tinha como principal objetivo erradicar qualquer vestígio de capitalismo que houvesse no país e consolidar, de vez, as propostas comunistas que foram criadas com o movimento. Mudanças drásticas ocorreram em todo o território chinês e pessoas de todas as idades e classes foram seriamente atingidas. O próprio pai de Huihan Liu, que era um professor de literatura chinesa antiga, foi deposto de seu cargo e obrigado a seguir com a família para o campo, onde faria reeducação socialista. HUIHAN LIU - Conversas da manhã - Óleo sobre tela - 61 x 76,2 Como bom artista, Liu ainda foi mantido nos estudos da escola secundária, juntamente com outros estudantes que se destacaram. Eram obrigados, porém, a criar obras que glorificassem o partido e os seus líderes. Huihan Liu ainda se dizia de sorte, por estar fazendo aquilo que sempre quis, desenhar e pintar. Passava todo seu tempo pintando intermináveis propagandas do Presidente Mao e de seus exércitos. Nos raros momentos de folga, pintava algumas paisagens. HUIHAN LIU - Brumas da manhã na vila - Óleo sobre tela Seus horizontes se abriram, pela primeira vez, em 1967, em uma visita que fez ao extremo oeste da China. Lá, viu diferentes costumes e estilos da região que ele morava. Mas, novamente as coisas se dificultariam nos próximos anos. Após o término de seu ensino médio como artista, Liu foi designado a trabalhar numa fábrica. Incansável, conseguia economizar alguns recursos para comprar o mínimo de material artístico, e aderir a um grupo local de artistas que se reunia para pintar nos momentos de folga. Esquerda: HUIHAN LIU - Visitas do feriado - Óleo sobre tela - 61 x 45,7 Direita: HUIHAN LIU - Três gerações - Óleo sobre tela - 91 x 45,7 Somente em 1972, quando a forte opressão de mais de uma década começou a diminuir, Huihan Liu começou a ter boas notícias para sua carreira artística. A Academia de Belas Artes de Guangzhou estava aceitando candidaturas e foi, com o auxílio de um de seus antigos mestres, Zhang Ton, que ele conseguiu o consentimento para ser admitido nela. Segundo o próprio Liu, “foi uma experiência maravilhosa”. Após a formatura, em 1975, o Estado o colocou na organização de reuniões para sindicais e o designou para pintar retratos de Mao (que morreu em 1976). "E no meu tempo livre", acrescenta ele, "eu estava pintando para a minha família, amigos e vizinhos." HUIHAN LIU - Dia de mercado - Óleo sobre tela - 40,6 x 50,8 A felicidade atingiria o grau máximo para o artista quando, em 1979, foi indicado para o cargo de professor na Academia Guangzhou. Além de ensinar, ele poderia ter tempo para pintar aquilo que quisesse. Não perdia tempo, produzia várias ilustrações para livros didáticos, como um trabalho freelance. E ainda não mediu esforços para se pós-graduar em Guangzhou, entre 1985 e 1987. Seu mundo já parecia pequeno e ele queria sempre mais. Com pouco mais de trinta anos de idade, ele agora fazia planos de conhecer museus ocidentais e visitar as pinturas originais que sempre pode admirar somente por livros e revistas. Veio a realizar esse seu sonho, quando foi aceito na Academy of Art University, em São Francisco, nos Estados Unidos. Com muito pesar, deixou esposa e filho para trás e partiu para lá. Eles se juntaram a ele somente um ano depois. Ele se graduou nessa faculdade em 1993. Diante de um mercado bem mais promissor que o chinês naquela época, Liu se naturalizou cidadão americano em 1999. HUIHAN LIU - Voltando para casa - Óleo sobre tela - 61 x 45,7 O artista foi ganhando experiência com o novo mercado e se adaptando da melhor maneira que conseguia. Foi somente em 1995, que aconteceria uma grande virada na sua carreira artística. Liu viajou novamente para o Tibete, na mesma região que visitara oito anos atrás. Ele afirmou naquela época: “Essas pessoas se hospedaram em meu coração, e sinto que, se puder expressar a paixão que sinto por elas, os americanos possam se interessar pelo meu trabalho”. Munido de esboços e fotografias que colheu em sua estadia por lá, retornou para o estúdio de São Francisco e se pôs a produzir tudo aquilo que havia lhe emocionado bastante na viagem. Rapidamente, seu trabalho foi ganhando notoriedade e agradando crítica e público. Havia sinceridade em tudo que produzia e isso lhe bastava. Aos 44 anos de idade, ingressava de vez como um respeitado artista do mercado americano. HUIHAN LIU - Antes da colheita - Óleo sobre tela - 76,2 x 101,4 - 2005 Sua carreira ainda continua fundamentada com a produção nas aldeias tibetanas, para onde viaja sempre que possível, mas, também expandiu sua produção com temáticas indígenas do oeste americano. Versatilidade não lhe falta. Continua desenvolvendo um realismo com forte influência impressionista, como ele mesmo gosta de classificar. Mais do que nunca, o artista procura penetrar no íntimo de cada pessoa e fazer da sua arte, uma ponte delas com o mundo. Seja na China, com os aldeões dos locais mais remotos, ou com descendentes indígenas do oeste americano, Liu se vê um artista das pessoas do mundo. Ele também adquiriu respeito e notoriedade no seu país de origem, tendo inclusive livros lançados por lá. Os anos difíceis do passado foram finalmente recompensados. Liu olha para trás e os vê como degraus necessários e valiosos para chegar onde chegou. PARA SABER MAIS: http://www.huihanliuart.com/
Teamwork is a collaborative or joint effort by a group of people who work together interdependently with each other
A Maçonaria é a congregação militante daGnose. Todos os Mestres da Ordem, conhecedores da ciência maçônica, têm dito isso incessantemente. Basta, para se convencer disso, examinar seus escritos, seus manuais de base, os rituais e as instruções dos diferentes graus. Contudo é necessário desembaraçar essas obras clássicas da Maçonaria de toda uma miscelânea simbólica ou alegórica que torna a leitura delas tão penosa para uma inteligência comum. Assim, descobriremos a substância de seu ensinamento e ficaremos completamente espantados ao nos depararmos com pessoas conhecidas. A DIVINDADE MAÇÔNICA A Maçonaria é uma Super-Religião: “A Maçonaria, diz o I.. Albert Pike – Morals and Dogma -, ensina e tem conservado em toda sua pureza os princípios fundamentais da velha fé primitiva, que são as bases sobre as quais se apoia toda religião. Todas as religiões que existiram até aqui tiveram um fundo de verdade e todas a encobriram com erros. As verdades primitivas ensinadas pelo Redentor foram mais rapidamente corrompidas, misturadas e aliadas a ficções que quando elas foram ensinadas aos primeiros homens”. Outrossim, “a Maçonaria, afirma o Dr. Mackey, não tem de forma alguma a pretensão de ocupar um lugar entre as religiões do mundo, entendidas como seitas ou sistemas particulares de fé e de culto, pelo quê distinguimos o Cristianismo do Judaísmo…” Assim, portanto, ela é a Religião universal (e, portanto, eminentemente católica, mas não romana, pois essa última é a religião particular dos romanos, logo, uma seita infestada pelos micróbios e as corrupções do país e do clima romano). Ela solicita aos iniciados apenas a adesão a duas verdades fundamentais: a crença na existência de Deus e na imortalidade da alma. Todavia, é preciso entender bem o que a ciência maçônica entende por isso. Albert Pike nos mostra “Deus como Pai infinito de todos os homens…”; “A Natureza, acrescenta ele, entendendo por essa palavra a totalidade dos seres, eis o que é poderoso, ativo, sábio e bom”. “A Natureza tira de si mesma sua própria vida, ela foi, é e será a causa de sua existência, o espírito do Universo e sua própria Providência. Há, na verdade, um plano e uma vontade, das quais provém a ordem, a beleza e a harmonia: esse plano e essa vontade pertencem à Natureza…”. Podemos nos perguntar como um ser (a Natureza) poderia ser a causa de si mesmo e, portanto, agir antes de existir? Porém pouco importa! “Deus, acrescenta Albert Pike, é a alma viva, pensante, inteligente do Universo, o Permanente, o Imutávelde Simão, o Mago, o Uno que é de Platão, etc. (Vê-se que o conhecedor da ciência maçônica conhece os bons autores e se refere a eles como aos seus mestres)”. Ele precisa até: “Enquanto que o indiano nos diz que Parabrahma, Brama e Paratma compõem a primeira Trindade, que o egípcio adora Amom-Rá, Neith e Ptah (Thot ou Hermes) e que o piedoso cristão acredita que o Verbo habita no corpo mortal de Jesus de Nazaré… a Maçonaria inculca sua velha doutrina, e nada mais… Segundo a Cabala, Deus e o Universo são apenas um. Segundo Pitágoras, Deus era uno, uma única substância cujas partes contínuas se prolongariam através do universo, sem separação. Pitágoras faz assim do Universo um Grande Ser, inteligente como o Homem, uma imensa divindade, tendo em si o que o homem tem em si, o movimento, a vida, a inteligência. Tal é, meu irmão, o verdadeiro Segredo Real“. Reconhecemos aí a doutrina do Emanatismo, essencial à Gnose. Porém é necessário precisar que a referência a Pitágoras se aplica à seita neo-pitagoriciana, aquela que compôs os “Versos de Ouro” cujos falamos. O verdadeiro nome dessa divindade maçônica é “Jeová“, o tetragrama sagrado, a “Palavra Perdida” base do dogma e dos mistérios maçônicos. Jeová (outra forma da palavra Yahvé na Bíblia) procede por emanação, estende-se, emite partes de si mesmo num espaço vazio preparado para recebê-las. Mais ainda, dizem nossos conhecedores da Maçonaria, Jeová é o próprio homem, Adam-Kadmon, o Arquétipo (diríamos, hoje, o Protótipo) da humanidade, a primeira emanação da divindade, o “Filho de Deus”. Assim, “é a Humanidade que cria Deus, diz o I.. Pike, e os Homens acreditam que Deus os fez à sua imagem, porque eles o fazem à deles”. Compreendemos por essa fórmula que a Divindade maçônica se criou a si mesma estendendo-se sob as formas humanas, que são as mais perfeitas emanações do Grande Ser. Mas não confundamos! O “Jeová”, divindade maçônica, não tem nada a ver com o “Jeová” da Bíblia, outro nome de Yahvé, aquele do Deus criador. Com efeito, “por toda parte, a divindade do Antigo Testamento, diz ainda Albert Pike, sempre em Morals and Dogma, é representada como o autor direto do Mal, enviando aos homens espíritos maus e enganadores (Entre parênteses, trata-se dos anjos e dos profetas)…O Deus do Antigo Testamento e de Moisés se rebaixou ao nível das paixões humanas… ele é uma divindade violenta, invejosa, vingativa, tanto quanto inconstante e irresoluta. Ela comanda atos odiosos e revoltantes de crueldade e de barbárie…” O ódio do Deus Criador é a pedra angular, o caráter específico de toda a Gnose, e isso é uma blasfêmia! A Maçonaria a tomou emprestada da Gnose. A ALMA HUMANA “A Alma, diz ainda Albert Pike, é de natureza divina, tendo se originado numa esfera mais próxima da divindade, e para lá retornando quando ela for desembaraçada do despojo do corpo, podendo entrar lá apenas purificada de todas as sujeiras do pecado que foram, por assim dizer, incorporados à substância em consequência de sua união com o corpo… O Maçom que possui o Segredo Real pode demonstrar que a alma, quando ela tiver sido despojada da matéria que a envolve e que a tem subjugado, quando ela tiver sido desembaraçada do invólucro que a deforma, reencontrará sua verdadeira natureza e se elevará, por graus, por meio da escada mística das esferas (são os éons dos nossos gnósticos) para ganhar novamente sua primeira morada, seu lugar de origem“. Qualquer comentário diminuiria a força de tais afirmações que foram copiadas diretamente das obras gnósticas. O GRANDE ARQUITETO DO UNIVERSO A Maçonaria se propôs como finalidade a reconstrução do Templo de Jerusalém, ou seja, a reconstrução da Humanidade. Por que reconstruir? Senão porque o primeiro demiurgo, Yahvé, tinha falhado em sua criação. Reconstruir a Humanidade, para o Maçom consciente e profundamente iniciado, é realinhar o retorno à Unidade das almas dispersas nos corpos, é perfazer a Divindade primitiva, levá-la à plenitude, é a “Grande Obra”. Outrossim a Iniciação constitui um “choque humanitário”. Por sua iniciação, o Iluminado “abre os olhos”, vê, enfim, em sua religião, as corrupções que deformaram a revelação primitiva, e “penetra na Verdade, depois de ter vagueado entre os erros, completamente coberto pelas sujeiras do mundo exterior e profano…” É preciso, portanto, purificar a Humanidade e reconstrui-la de acordo com o plano de um arquiteto divino. Que o iniciado tome seu avental, arme-se com o compasso, a espátula, o esquadro e o triângulo, e que ele se coloque a trabalho: “Nosso trabalho constitui nosso culto”. Mas para isso, é preciso proceder com ordem; é preciso conhecer a ciência da geometria. O irmão iniciado é um construtor do Templo da Humanidade, ele precisa de um arquiteto, um Grande Construtor, um Grande Geômetra: “O Grande Arquiteto do Universo… é um contramestre, sob as ordens do qual devemos trabalhar como operários”. Na verdade, ele é divino, assim como o Homem após sua Iluminação pelo rito da Iniciação; porém ele não é a Divindade total, o “Jeová”. “A Maçonaria, diz Oswald Wirth, em seu livro Livro do Mestre, evita definir o Grande Arquiteto do Universo e deixa a cada um de seus adeptos a total liberdade para se fazer, dele, uma ideia conforme à sua fé ou à sua filosofia. Evitemos, portanto, ceder a essa preguiça de espírito que confunde o Grande Arquiteto dos Iniciados com o Deus dos crentes”. Eis o que é claro: não é preciso definir sobretudo a natureza desse arquiteto, e nem lhe dar um nome que permitiria identificá-lo. Porém os verdadeiros Iniciados, os “Mestres do Segredo Sublime”, aqueles que penetraram antes nos mistérios da Grande Arte real, conhecem bem seu nome. “A Serpete, diz Oswald Wirth, em seu Livro do Companheiro, inspiradora da desobediência, da insubordinação e da revolta, foi maldita pelos antigos teocratas, enquanto que ela era honrada entre os Iniciados. Estes consideram, com efeito, que não pode haver nada de mais sagrado do que as aspirações que nos levam a nos aproximar progressivamente dos deuses considerados como as potências conscientes, encarregadas de ordenar o caos e de governar o mundo. Tornar-se semelhante à divindade, tal era o fim dos antigos mistérios. Em nossos dias, o programa da iniciação não mudou”. Assim, portanto, a Serpente é chamada pelos Grandes Iniciados a ordenar o caos de um mundo mal feito por um demiurgo desastrado, para reconstrui-lo de acordo com um plano perfeito, aquele do Grande Templo da Humanidade e, assim, “conseguiremos realizar a última palavra do Progresso, o Homem, sacerdote e rei de si mesmo, que dependerá apenas de sua vontade e de sua consciência” (Ragon, Cours philosophique). ********* ALGUNS HERDEIROS DA GNOSE MODERNA O homem moderno é um “gnóstico sem sabê-lo“. Como se espantar com isso? A sociedade de hoje está quase que completamente impregnada pelos ideais maçônicos. Os modos de pensar atuais saíram das lojas por uma multidão de sociedades, clubes, grupos de pressão. A Igreja em si não se defende mais contra essa nova invasão bárbara, mais destruidora que a precedente, porque ela se obstina em demolir o que resta da civilização cristã. Não é nossa intenção nos comportarmos de modo erudito, tanto mais porque isso já foi feito. Não queremos descrever com minúcias as formas tomadas atualmente pelos gnósticos modernos: isso seria perturbar o leitor e confundir os espíritos. Queremos, ao contrário, “clarificar” essas gnoses e aí reencontrar as fórmulas primitivas; mais ainda, nos esforçamos para reencontrar, sob a miscelânea das mitologias modernas, as grandes direções do pensamento que se mantém e se desenvolvem ao longo dos séculos. Com efeito, existe um progresso no erro, como na verdade. Certos espíritos, atraídos pela aparência de verdade que os falsos princípios podem conter, não veem imediatamente todas as consequências de suas afirmações; todavia, as gerações seguintes vão se dirigir a elas necessariamente, visto que essas consequências estão contidas implicitamente nas premissas. Assim veremos que Freud, Jung, Hegel e Marx não falharam em desenvolver a gnose na linha da maior subversão; visto que a Psicanálise ou o Marxismo são sim religiões; mas completamente invertidas: não se pode substituir impunemente o culto de Satanás ao de Jesus Cristo. A subversão de toda ordem cristã é “fecunda” em catástrofes apocalípticas. Satanás continua “homicida” e “mentiroso” até o fim dos séculos. Acabamos de mostrar que a Maçonaria é a herdeira e a verdadeira detentora da Gnose. Vimos, no Rito do Rosa Cruz, 18º grau, que ela pratica o Amor pela Humanidade, que ela ensina a Roda Universal das Coisas e a Evolução do Grande Todo. É do seio das lojas que nasceram os grandes movimentos contemporâneos que se esforçam para divulgar, numa sociedade descristianizada, as fórmulas e as práticas gnósticas. COUVERT, Etienne. De la gnose à l’oecumenisme. Tradução de Robson Carvalho. Montreuil, Éditions de Chiré, 1983, p.32-37. Fonte: http://catolicosribeiraopreto.com/